TEOLOGIA
PÓS-MODERNA
(Epistemologia,
sistemática e teórico-prático)
Prof. Dr. Adilson
Luiz P. de Oliveira
MAÇONARIA
(L: 2c – A VIRTUDE DA FÉ)
Conservação da Fé1 – Deus chama-nos a
vida moral
E´ proibida a pertença: a sociedades
secretas (maçons, lions international, Rotary
international, illuminati, cavaleiros templários, AMORC, De Molays, Shrines, The Daughters of the Nile
(As Filhas do Nilo), Amaranth, Estrela do Oriente, Grotto, , Rito de York, Rito
Escocês, P2, Skull and Bones (Caveira e Ossos), Ordem do Dragão.)
Citações:
-2511s
: Carta
Apostólica “In eminenti apostolatus speculta”, 28-abril -1738. Esse decreto
dirigido a todos os fiéis parece o editio mais antigo a respeito dos “maçons”,
Bento XIV o retomou na Constituição “Providas Romanorum Pontificum” de 18 maio
de 1751 (Bento XIV, Bullarium [Roma 1754] 3,214s/ [Prati 1846] 3/I (= Opera
omnia 17) 283b-284ª/[Malinas] 8,416s). Ed. BullTau 24, 366aa-367b/BullCocq
14,236ab/CdICF 1,656s, n. 299.
“Os
Livres pedreiros”-
-2783:
Encíclica
“qui pluribus”, 9 nov. 1846- Pio IX
Ed.: Pio IX. Acta (Roma
1854) 1/I. 6-13/ ColllLac 6, 83b-85d[*2775-2781];85ª-c[*2782-2786]/ACColon
233-235[somente *2775-2781].
O erro do racionalismo
-2894:
Encíclica
“Quanta cura”, 8 dez. 1864 – Ed: Ass 3 (1867/68;1878) 163-166/Pio IX, Acta
I/III, 691-695 / Katholik 45/I (1865) 4-8.
Independência do poder
da Igreja do poder civil
-3156-3158:
Encíclica “Humanum genus”, 20 abr. 1884 – Ed. ASS 16 (1883/84) 420s; 430/Leão
XIII, Acta, Roma 4, 49-65/Bruges 2, 60s;71
Os
“franco-maçons”
3159-3160:
Instrução do S. Ofício “Ad gravíssima advertenda”, 10 mai. 1884 – Esta instrução
acerca dos franco-maçons se destinava a todos os bispos do mundo. Ed.: ASS 17
(1884/85) 44/ CollPf 2, 119,n. 1615/ Leão XIII, Acta, Roma 4, 81s
Os
“franco-maçons”
I-
Primeiramente, deve-se diferenciar o
erro (1ª.coisa) da pessoa que erra(2ª.coisa).
A dignidade da pessoa (3996,4316,4328). Como se diz no popular Deus ama
misericordiosamente o pecador e não o pecado. Pois, o pecador pela ação de Deus
no momento da concepção e fecundação recebeu uma alma imortal e a dignidade
pessoal de ser imagem e semelhança e isso é inato.
II-
Iniciativas social e cultural – há erros
filosóficos produzidos com as iniciativas sociais e culturais.
O
pecado (erro filosófico: racionalismo naturalista),
implica na doutrina e nos ritos anti-cristãos que não são aceitos pela Sagrada
Escritura, Sagrada Tradição e o Sagrado Magistério.
O
pecador, a pessoa em si, possui uma dignidade pessoal de ser imagem e semelhança de Deus e de possuir uma alma imortal inatas na
fertilização pela onipotência e ação divina. E, escatologicamente a alma
imortal e a pessoa divina unamente participará da 1ª. morte (física) e da 2ª.
morte, espiritual, na Parusía. Isso, só não se dará mediante a ação salvadora e
a graça divina na história da salvação da humanidade.
Exemplo:
O maçon participa da Santa Missa mais não comunga, o sacramento da eucaristia está
em estado de ex-comunhão (fora).
A dignidade da pessoa
humana não pode ficar sem a Liturgia da Palavra(vereração), sem a Liturgia
Eucarística(adoração), sem a Liturgia da Música(culto de louvro). Logo,
participa-se presencialmente do Sacrifício (Liturgia: servitium + sacrifitium +
misterium). Podendo comungar espiritualmente e ficando fora (ex) do sacramento
da comunhão (comum união) eucarística. Isso, é serve pra todo que estiver em
pecado grave. Para não comungar sua própria condenação ou praticar um
sacrilégio durante o rito da celebração.
III-
O que é de direito, que o maçon pode fazer:
1-Mandar celebrar missa (corpo presente,
7º.dia, gregoriana, para alma, em ação de graças, por uma graça, por um milagre, etc.);
2- Participar do Rito Litúrgico (celebração
da Palavra, missa, sacramentos, ato ecumênico, etc.);
3-Fazer doações com prestação de contas
ao Ecônomo Diocesano;
4-Pagar dízimo e ofertar na missa.
IV-
O que o maçon não pode, não lhe dá o direito:
1- Receber
nenhum sacramento sem a devida conversão e absolvição (renúncia e confissão), pelo
ministro ordenado em comunhão com o Papa;
2- Ser
líder de movimento dentro da Igreja, mas podendo participar;
3- Ser
Padrinho ou Madrinha de Sacramentos (batismo, eucaristia, crisma e matrimônio);
4- Ser
catequista ou diretor nas Instituições da Igreja Católica.
Obs.: Ato ilícito –
consciência do ato ilícito, conversão/renúncia, confissão. Para estar em
comunhão plena com a Igreja e seus mandamentos. A Igreja Militante não pode
excluir a dignidade da pessoa que é imagem e semelhança de Deus e nem ignorar um
ser humano que tem uma alma imortal. O erro filosófico, ato anti-cristão, é
diferente da dignidade pessoal do ser que possui um corpo, uma alma e um
espírito teórico-prático-ontológico.
CONDENAÇÕES À MAÇONARIA.
A Santa Igreja Católica condenou os maçons e sociedades similares que conspiram contra a verdadeira Igreja. Papa Clemente XII, In Eminenti, 1738: “Nós decidimos condenar e proibir tais sociedades, assembleias, reuniões, convenções, agregações ou encontros chamados tanto Franco-maçônicos ou sob algum outra denominação desconhecida ... a abster-se da comunicação com tais sociedades ... para evitar excomunhão, que será a penalidade imposto sob todos aqueles transgredindo essa nossa ordem.” .
O Papa Leão XIII condenou os franco-maçons em várias encíclicas:
“2. ... os partisans (guerrilheiros) do mal parecem estar se reunindo, e estar combatendo com veemência unida, liderados ou auxiliados por aquela sociedade fortemente organizada e difundida chamada os Maçons. Não mais fazendo qualquer segredo de seus propósitos, eles estão agora abruptamente levantando-se contra o próprio Deus. Eles estão planejando a destruição da santa Igreja publicamente e abertamente, e isso com o propósito estabelecido de despojar completamente as nações da Cristandade, se isso fosse possível, das bênçãos obtidas para nós através de Jesus Cristo nosso Salvador. Lamentando estes males, Nós somos constrangidos pela caridade que urge Nosso coração a clamar freqüentemente a Deus: "Ó Deus, eis que Teus inimigos se agitam; e os que Te odeiam levantaram as suas cabeças. Eles tramam um plano contra Teu povo, e conspiram contra Teus santos. Eles disseram: 'vinde, destruamo-nos, de modo que eles não sejam uma nação'.” (...)
“4. Os Pontífices Romanos nossos predecessores, em sua incessante vigilância pela segurança do povo Cristão, foram rápidos em detectar a presença e o propósito desse inimigo capital tão logo ele saltou para a luz ao invés de esconder-se como uma tenebrosa conspiração; e, além disso, eles aproveitaram e tomaram providências, pois a eles isso competia, e não permitiram a si mesmos serem tomados pelos estratagemas e armadilhas armadas para enganá-los.
5. A primeira advertência do perigo foi dada por Clemente XII no ano de 1738[3], e sua constituição foi confirmada e renovada por Bento XIV[4]. Pio VII seguiu o mesmo caminho[5]; e Leão XII, por sua constituição apostólica, Quo Graviora[6], juntou os atos e decretos dos Pontífices anteriores sobre o assunto, e os ratificou e confirmou para sempre. No mesmo sentido pronunciou-se Pio VIII[7], Gregório XVI[8], e, muitas vezes, Pio IX[9] .
6. Tão logo a constituição e o espírito da seita maçônica foram claramente descobertos por manifestos sinais de suas ações, pela investigação de suas causas, pela publicação de suas leis, e de seus ritos e comentários, com a freqüente adição do testemunho pessoal daqueles que estiveram no segredo, esta sé apostólica denunciou a seita dos Maçons, e publicamente declarou sua constituição, como contrária à lei e ao direito, perniciosa tanto à Cristandade como ao Estado; e proibiu qualquer um de entrar na sociedade, sob as penas que a Igreja costuma infligir sobre as pessoas excepcionalmente culpadas.”(...)
24. O que, portanto, a seita dos Maçons é, e que trilha ela persegue, aparece suficientemente do sumário que Nós resumidamente demos. Seus dogmas principais estão tão grandemente e manifestamente apartados da razão que nada pode ser mais perverso. Desejar destruir a religião e a Igreja que o próprio Deus estabeleceu, e cuja perpetuidade Ele assegura por Sua proteção, e trazer após um lapso de dezoito séculos as maneiras e costumes dos pagãos, é notável insensatez e audaciosa impiedade. Nem é menos horrível nem mais tolerável que eles repudiem os benefícios que Jesus Cristo tão misericordiosamente obteve, não somente para os indivíduos, mas também para as famílias e a sociedade civil, benefícios os quais, mesmo de acordo com o julgamento e testemunho de inimigos da Cristandade, são muito grandes. Nesta empreitada insana e pervertida nós quase podemos ver o ódio implacável e o espírito de vingança com o qual o próprio Satanás está inflamado contra Jesus Cristo. - Do mesmo modo o estudado esforço dos Maçons para destruir as principais fundações da justiça e honestidade, e para cooperar com aqueles que desejarem, como se fossem meros animais, fazer o que eles quiserem, tende somente para a ignominiosa e desgraçada ruína do gênero humano.” (...)
“31. Nós rogamos e imploramos a vós, veneráveis irmãos, a juntar os vossos esforços com os Nossos, e esforçadamente lutar pela extirpação desta praga maligna, que está se esgueirando através das veias do corpo da política. Vós deveis defender a glória de Deus e a salvação do vosso próximo; e com o objetivo de vosso combate à vossa frente, nem coragem nem força irão faltar. Será por vossa prudência que julgareis por quais modos vós podeis melhor sobrepujar as dificuldades e obstáculos com os quais vos encontrardes. Mas, como pertence à autoridade de Nosso ofício que Nós mesmos apontemos algumas maneiras apropriadas de procedimento, Nós desejamos que o vosso primeiro ato seja arrancar a máscara da Maçonaria, e deixar que ela seja vista como realmente é; e por sermões e cartas pastorais instruir o povo quanto aos artifícios usado pelas sociedades deste tipo para seduzir os homens e persuadi-los a entrar em suas fileiras, e quanto à perversidade de suas ações e à maldade de seus atos. Como Nossos predecessores por muitas vezes repetiram, que nenhum homem pense que ele possa por qualquer razão que seja ajuntar-se à seita maçônica, se ele dá valor ao seu nome Católico e à sua salvação eterna como ele deveria valorizá-los. Que nenhum seja enganado por uma pretensão de honestidade. Pode parecer a alguns que os Maçons não exigem nada que seja abertamente contrário à religião e à moral; mas, como todo princípio e objetivo da seita está naquilo que é vicioso e criminoso, ajuntar-se com estes homens ou em algum modo ajudá-los não pode ser legítimo.” (...)
“37. ... A seita da Maçonaria mostra-se insolente e orgulhosa de seu sucesso, e parece que ela não colocará limites à sua pertinácia. Seus seguidores, ajuntados por perversos acordos e por conselhos secretos, ajudam-se uns aos outros, e excitam-se uns aos outros a uma audácia nas coisas malignas. Um ataque tão veemente exige uma igual defesa - especificamente, que todos os homens de bem formem a mais abrangente associação possível de ação e de oração.”
Papa Leão XIII, Oficio Sanctissimo, 1887: “12. É da mesma forma uma matéria de extrema importância, Veneráveis Irmãos, que vocês venham a se prevenir e guardar seu rebanho contra os perigos surgindo do contágio da Franco-maçonaria. Nós demonstramos em um especial Carta Encíclica quão cheios de mal e perigo ao Estado possui essa seita de escuridão, e nós apontamos meios para contrair e destruir sua influência. O fiel nunca pode ser suficientemente avisado contra essa facção maligna, pois embora desde o início concebeu-se um profundo ódio contra a Igreja Católica, e desde muito este cresceu e inflamou-se, sua inimizade é não sempre abertamente revelada, mas mais freqüentemente exercita-se de uma forma hipócrita e clandestina, especialmente entre os jovens, que, não experimentados e carentes de sabedoria, são tristemente enlaçados por suas fraudes freqüentemente escondidas sob a aparência de piedade e caridade.”
Papa Leão XIII, Dal’ Alto dell’ Apostolico Seggio, 1890: “É desnecessário agora por as seitas maçônicas sob julgamento. Elas já estão julgadas; seus fins; seus meios, suas doutrinas, e suas ações são todas bem conhecidas com indisputável certeza.Possuídas pelo espírito de Satã, a qual é seu instrumento, elas incendeiam como ele um ódio mortal e implacável de Jesus Cristo e Sua obra; e eles esforçam-se por todos os meios para refreá-lo e destruí-lo.”
Papa Leão XIII, Custodi Di Quella Fede, 1892: “Lembre que o Cristianismo e a Maçonaria são essencialmente irreconciliáveis, tal que a união a um implica na separação de outro. Vocês não podem mais ignorar essa incompatibilidade entre Católico e maçom, amados filhos: vocês foram avisados abertamente por Nossos Predecessores, e Nós repetimos sonoramente o aviso.”
E as condenações papais da Franco-Maçonaria estão contidas no atual Código de Direito Canônico de 1917, Cânon 2335:
Código de Direito Canônico de 1917: “Cânon 2335. Afiliação com sociedades maçônicas ou similares. Aquele que integrar uma seita maçônica ou outras sociedades da mesma natureza, que conspiram contra a Igreja ou contra uma autoridade civil legítima, incorre numa excomunhão ipso facto simplesmente reservada à Santa Sé.”
BULA
IN EMINENTI
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A Maçonaria e a Igreja
Em síntese: O artigo percorre a
história das relações da Igreja com a Maçonaria, pondo em evidência a razão
principal da incompatibilidade entre aquela e esta: a Maçonaria, oriunda no
século XVIII em Londres, apregoa o relativismo frente a Religião – o que
redunda em detrimento da Verdade. Tal relativismo tornou-se hostilidade na
França do século passado, quando a Grande Loja cancelou as suas referências ao
Grande Arquiteto do Universo. Essa atitude avessa à Igreja provocou no Brasil a
chamada “Questão Religiosa’ sob o Imperador D. Pedro II, tendo como vítimas
encarceradas os Bispos D. Frei Vital, de Olinda (PE), e D. Macedo Costa, de
Belém (PA). Aliás, em toda a América Latina a Maçonaria exerceu influência
fortemente negativa sobre a Religião, cerceando-a de vários modos. É por isto
que em 1983, por ocasião da promulgação do novo Código de Direito Canônico, a
Igreja mais uma vez desde 1738, declarou a incompatibilidade, afirmando estar
excluído dos sacramentos o católico que se filie à Maçonaria. As tentativas de
diálogo e conciliação havidas nos últimos decênios apenas contribuíram para
evidenciar a inconciliabilidade entre Igreja e Maçonaria. Acompanhando a Igreja
Católica, outras confissões cristãs (até mesmo a Comunhão Anglicana, da
Inglaterra, país onde a Maçonaria é forte) têm-se mostrado reservadas ou mesmo
avessas às Lojas Maçônicas; o relativismo doutrinário e o caráter secreto das
mesmas não se coadunam com a mensagem do Cristianismo.
Visto que a Maçonaria continua
presente na vida da população brasileira, a nossa revista publica um artigo do
Pe. Jesus Hortal S. J., eminente canonista, que evidencia o porquê da
incompatibilidade entre Catolicismo e Maçonaria. – Ao Pe. Hortal seja aqui
registrada a gratidão de PR pela autorização para publicar o seu valioso
artigo, cujo texto se segue.
1. Uma condenação que passou para a
História
No dia 28 de abril de 1738, o Papa
Clemente XII promulgou a Bula In eminenti apostolatus specula. a primeira
condenação pontifícia da Maçonaria. Apenas 21 anos separavam esse documento da
data que se costuma indicar como o inicio da Maçonaria moderna: 1717. Que
razões levaram a Santa Sé a condenar uma sociedade que, pelas suas próprias
características, não podia ser suficientemente conhecida das autoridades
romanas daquele tempo?
Alec Mellor, conhecido advogado
católico francês, iniciado na Maçonaria no dia 29 de março de 1969, sustenta
que “o motivo da condenação não era religioso… os motivos do Papa eram de ordem
política e ligados ao destino da infeliz família real dos Stuart, destronada e
refugiada em Roma, sob a proteção da Igreja”(1). Um historiador de tendências
manifestamente favoráveis à Maçonaria inglesa, o Pe. Ferrer Benimeli, afirma
que “esta hipótese é totalmente insustentável do ponto de vista histórico, à
luz da documentação vaticana da época”.(2)
O próprio documento de Clemente XII
é algo obscuro na sua redação. Compreende-se, porém, melhor no resumo dele
feito na Bula Providas Romanorum Pontificum, promulgada pelo Papa Bento XIV aos
18 de maio de 1751. Neste segundo documento, seguindo o anterior, enumeram-se
seis razões para a condenação:
“a primeira é que, nas tais
sociedades e assembléias secretas, estão filiados indistintamente homens de
todos os credos; daí ser evidente a resultante de um grande perigo para a pureza
da religião católica;
“a segunda é a obrigação estrita do
segredo indevassável, pelo qual se oculta tudo que se passa nas assembléias
secretas;
“a terceira é o juramento pelo qual
os maçons se comprometem a guardar inviolável segredo, como se fosse permitido
a qualquer um apoiar-se numa promessa ou juramento com o fito de furtar-se a
prestar declarações ao legitimo poder.. .;
“a quarta é que tais sociedades são
reconhecidamente contrárias às sanções civis e canônicas…;
“a quinta é que em muitos países as
ditas sociedades e agremiações foram proscritas e eliminadas por leis de
príncipes seculares;
“a última enfim é que as tais
sociedades e agremiações são reprovadas por homens prudentes e honestos..(3)
Numa leitura superficial, com a
nossa mentalidade, tem-se a impressão de que, deixando de lado o problema do
segredo, sobre cuja natureza e conteúdo nada se diz nas Bulas, nada há de
verdadeiramente grave, capaz de justificar a pena, cominada, de excomunhão
latae sen-tentiae.(3a) Um exame mais atento, porém, permite vislumbrar motivos
doutrinários mais profundos. Com efeito, no parágrafo 4 da Bula In eminenti,
Clemente XII manda aos Ordinários locais e aos Inquisidores que castigam os
transgressores com pena proporcionadas, tamquam de haeresi vehementer suspectos
(como pessoa veementemente suspeitas de heresia).(4) Ora, a única razão, dentre
as aduzidas pela Bula papal, capaz de levantar essa suspeita é a primeira;
nela, com efeito, se fala de “um grande perigo para a pureza da religião
católica”. O problema mais profundo parece consistir, portanto, na reunião de
pessoas de diversas religiões e credos, que poderia levar a considerar a
religião católica apenas como um caminho possível entre outros muitos. O
indiferentismo e o relativismo religioso não eram, no século XVIII, apenas
hipóteses teóricas, mas atitudes bem freqüentes nos ambientes iluministas.
Advirta-se, aliás, que Clemente XII não acusa os maçons de heresia, mas apenas
de suspeita veemente dela. O próprio fato da reunião de homens de diversos credos
não era nem é uma heresia, mas levantava a desconfiança dos guardiães da fé.
Nem o segredo, nem o juramento, nem a condenação dos poderes civis, nem a má
fama entre os homens “prudentes e honestos” poderiam justificar, por si sós,
essa suspeita de heresia. Ela se baseava exclusivamente no perigo que poderia
advir, para a fé, do contato com homens de outras religiões. Em 1738, resultava
muito difícil, para não dizer impossível, distinguir entre o diálogo com homens
de diversos credos, mas respeitosos para com a verdade católica, e o
indiferentismo destruidor do verdadeiro conceito de religião.
Duzentos e cinquenta anos após
aquela primeira condenação, a posição da Igreja Católica parece não ter mudado
muito. Como veremos, a razão básica da última condenação (23/11/83) continua a
ser a mesma: a inconciliabilidade entre a afirmação sincera e plena da fé
católica e o relativismo que parece ocultar-se atrás do universo simbólico
maçônico.
2. As condenações se repetem
Após as Constituições Apostólicas
In eminenti, de Clemente XII (1738) e Providas, de Bento XIV (1751), durante o
resto do século XVIII, não há outro documento pontifício de condenação solene
da sociedade maçônica. Quando, porém, chega o século XIX, multiplicam-se os
documentos neste sentido. É o “século das sociedades secretas” ou o “século das
seitas”, e a Maçonaria passa a ser considerada, nos meios vaticanos, como uma a
mais, a mais importante, entre elas. Assim, a Constituição Apostólica Ecclesiam
a lesu Christo (13/09/1821), do Papa Pio VII, condenou especialmente a
Carbonária, mas foi geralmente interpretada como uma condenação indireta da
Maçonaria, dado que citava explicitamente as Bulas de Clemente XII e de Bento
XIV. Também Leão XII, na Constituição Apostólica Quo graviora, de 13/05/1825, condenou
genericamente todas as sociedades secretas. Precisamente nesse documento
aparece, por primeira vez, a formulação que passará para o Código de Direito
Canônico: a de considerar a Maçonaria como uma sociedade que tem como
finalidade maquinar (ou seja, conspirar) contra a Igreja e os legítimos poderes
do Estado.
De Pio IX a Leão XIII, ou seja, de
1846 a 1903, encontramos nada menos do que 350 intervenções pontifícias contra
a Maçonaria. Praticamente todas elas vêem nas Lojas uma espécie de conspiração
contra a Igreja e os regimes monárquicos. Não se esqueça que a “aliança entre o
trono e o altar” não era, naqueles tempos, um mito, mas uma realidade muito
concreta. Por outro lado, o chamado “liberalismo doutrinário” representa uma
espécie de desenvolvimento lógico das teses iluministas, com as quais a
Maçonaria se identificara no século anterior. Nos países latinos, onde a
religião católica era a oficial do Estado, muitas das teses liberais vão
chocar-se não apenas com uma situação de fato, mas com a própria concepção do
Estado e da sociedade, defendida pela Filosofia e a Teologia neo-escolásticas.
A separação entre a Igreja e o Estado, e a proclamação da liberdade de
consciência, com a conseqüente secularização da vida social, propugnadas pelos
liberais, aparecem, naquela época, aos olhos de muitos católicos como ações
diretamente dirigidas contra a Igreja Católica e contra os legítimos poderes
constituídos. Daí a repetição das condenações da Maçonaria, que se apresenta
como impulsora dessa separação. Daí também a teoria conspiratória, que vemos
tão claramente exposta na encíclica Humanum Genus,de Leão XIII.
Em 1917, foi promulgado o primeiro
Código de Direito Canônico. Nele, mantém-se a proibição da filiação de
católicos à Maçonaria, com a mesma motivação tradicional: “os que dão seu nome
à seita maçônica ou a outras associações, que maquinam contra a Igreja ou
contra os legítimos poderes civis, incorrem, pelo próprio fato, em excomunhão
simplesmente reservada à Sé Apostólica” (cân. 1335; o sublinhado é nosso). Como
se vê, o Código estabelecia uma presunção de direito: a ação conspiratória
(machinatio) contra a Igreja e o Estado seria algo intrínseco à Maçonaria, que
não precisaria de ser comprovado na prática.
Mas o Código de 1917 não se
contentou com cominar a citada pena. Para os clérigos maçons, estabelece ainda
uma série de suspensões e privações, além de impor a obrigação de denunciá-los
ao Santo Ofício.
De acordo com o mesmo corpo legal,
os fiéis que se inscreviam na Maçonaria não podiam ser admitidos validamente ao
noviciado num Instituto Religioso, nem ser inscritos numa associação de fiéis,
nem exercer o encargo de padrinho de Batismo ou de Crisma; ficavam, também,
privados da sepultura eclesiástica e de qualquer missa exequial, assim como dos
direitos de padroado que, eventualmente, possuíssem. Os demais fiéis eram
exortados a não contrair matrimônio com maçons. Numa palavra, a legislação
canônica de 1917 indicava muito claramente uma incompatibilidade absoluta entre
Maçonaria e Igreja Católica.
3. Onde se situava a “machinatio”
maçônica?
É frequente escutar, entre
católicos, vozes em defesa da Maçonaria, alegando que pessoas a ela filiadas,
durante longos anos, nunca viram nem ouviram nas Lojas algo de semelhante a uma
ação concertada contra a Igreja ou o Estado. Em outros ambientes, pelo
contrário, espalhou-se a ideia da Maçonaria como um conjunto de criminosos,
dedicados a tramar conspirações tenebrosas contra tudo o que de bom e santo
possa existir. O Código de Direito Canônico de 1917 parece ir nessa última
direção, quando fala de maquinação. Mas em que consistia essa maquinação, cujo
protótipo eram as associações maçônicas?
De acordo com a interpretação comum
dos comentaristas daquele corpo legal, a palavra latina machinatio não
significava necessariamente o planejamento de ações concretas, destinadas a
destruir, pela força, a Igreja ou o Estado. Podia tratar-se de uma machinatio
ideológica, ou seja, da transmissão sistemática de ideias que entrassem em
conflito com as verdades católicas, mesmo que isso não fosse dito abertamente.
“Existe a machinatio, – escreve Regatillo, citando uma declaração do Santo
Ofício, de 10/05/1884 – se (a sociedade) pretende violar a liberdade e os
direitos da Igreja, afastar os fiéis dela, relaxar a disciplina, subverter, por
meios ilícitos, tanto aberta quanto clandestinamente, a organização social, a
forma legítima de governo ou a seguridade do Estado”.^ Não era necessário que a
sociedade em questão pretendesse fazer tudo isso; bastava esse “pretender
afastar os fiéis da Igreja”, para que pudesse ser enquadrada na condenação geral.
O protótipo dessa maquinação eram, conforme o Código de 1917, as associações
maçônicas.
Para compreender melhor o porquê de
acusação tão grave, tenha-se presente que, nos países de maioria católica, onde
essa religião era a oficial do Estado, não é estranho que as ideias de
liberdade fossem interpretadas, por uns e por outros, como apelos a uma ação
contra a Igreja Católica, considerada, pelos liberais, como um empecilho à
própria liberdade. Atualmente após a Declaração Dignitatis Humanae do Concilio
Vaticano II, podemos compreender que não é a mesma coisa, de um lado,
reconhecer a autonomia da pessoa humana, em matéria religiosa, frente a todas
as autoridade civis, e, de outro lado, reivindicar uma autonomia absoluta
perante o próprio Deus. Ora, as declarações do Syllabus de Pio IX condenavam, pura
e simplesmente, qualquer ideia de liberdade religiosa, como um mal em si,
absolutamente intolerável. Daí o surgimento, nos países latinos, de fortes
correntes libertárias, não só à margem, mas expressamente contra a Igreja
Católica. A separação entre Igreja e Estado, que hoje nos parece um ponto
pacífico, era encarada como uma meta que somente poderia ser atingida com a
derrota da Igreja Católica. Por outro lado, junto com essa separação,
propugnava-se a secularização dos cemitérios, do matrimônio e do ensino, a
liberdade irrestrita de imprensa, a confiscação dos bens eclesiásticos e até a
extinção de todas as Ordens e Congregações Religiosas. Todas essas foram
bandeiras defendidas nas Lojas do Grande Oriente da França e das “obediências”
maçônicas com ele relacionadas.
Em nenhum país a luta foi tão
violenta como na França; e em nenhum país mais do que na França, as Lojas
maçônicas reuniram, em seu seio, uma quantidade tão grande de
“livre-pensadores”. Em 1877, o Grande Oriente da França riscou de seus
estatutos e documentos o nome do Grande Arquiteto do Universo. Algo depois,
suprimiu todas as referendas religiosas e tomou uma feição com claras
inclinações ao ateísmo. “Idênticas alterações foram feitas nos Altos Graus,
especialmente no 30? (Cavaleiro Kadosh), que fora no século XVIII, conforme nos
relata Paulo Naudon, um grau cristão. Foram os ritualistas do século XX que o
transformaram numa pantomima em que eram pisoteadas a Tiara e a Coroa” (6) A
mesma tendência foi seguida pelos Grandes Orientes da Bélgica, da Espanha, da
Itália e, em parte, dos países latino-americanos, embora nem todos tenham
chegado aos extremos do ramo francês.
Alec Mellor descreve, do seguinte
modo, o clímax da luta da Maçonaria francesa contra a Igreja Católica:
“Em 19 de novembro de 1899, durante
a inauguração da estátua de Datou O triunfo da República, cerca de 4.000
franco-maçons, paramentados com seus ‘adornos’, haviam sido mobilizados peto
Grande Oriente para desfiarem diante dela, bradando: Viva a República social!
Abaixo os jesuítas!’
A
Convenção de 1902 vota uma moção de congratulações a Emile Combes,
presidente do Conselho, e uma outra de 151 votos contra 141, propondo que o
casamento religioso ou o Batismo dos filhos fosse considerado delito maçônico.
Em julho de 1902, Combes manda fechar mais de 3.000 escolas cristãs, criadas
antes mesmo da lei de 1o de julho de 1901 sobre associações. Em
setembro, ele obtém do Conselho de Estado um parecer, declarando inútil o exame
dos dossiês das Congregações, pedindo que fossem autorizadas… Durante o
ministério Briand, que lhe sucedeu, a França vive sucessivamente a lei de
Separação, a famosa circular sobre os inventários e os escândalos das verbas
para Missas. A política procedente das Convenções do Grande Oriente havia
atingido seus objetivos de guerra”. (7)
Apesar dos esforços para
estabelecer uma paz, ou pelo menos uma coexistência pacífica, entre católicos e
maçons, realizados por homens como Lantoine, o Pe. Berteloot, o Pe. Riquet e o
citado Alec Mellor, ainda em 1968 o então Grão Mestre da França, Jacques
Miterrand, comentando a frase de Garnier-Pages, sobre a relação entre a
Maçonaria e a República, acrescentava:
“Isto não significa apenas aderir
ao direito à auto-determinação, segundo o princípio por nós criado, mas
significa também servir à República, e isto exige, no nosso mundo ocidental,
também a rebelião contra as forças da reação encamadas pela Igreja Católica
Romana. Não nos contentamos em ser, ao interno de nossos templos, a República
secreta; somos, ao mesmo tempo, a anti-Igreja” (8).
Não generalizemos, porém,
indevidamente. O Grande Oriente da França não é reconhecido, como Maçonaria
regular, pela Grande Loja Unida da Inglaterra; a mesma coisa acontece com as
potências maçônicas que seguem uma orientação claramente anti-religiosa. No
Brasil, porém, permanece uma certa ambiguidade, porque o Grande Oriente do
nosso país ê reconhecido simultaneamente e mantém relações com a Grande Loja
Unida da Inglaterra e com o Grande Oriente da França. Por isso e por causa de
atitudes bem concretas em tempos passados, como na chamada “Questão Religiosa”,
somente um posicionamento claro, sem ambiguidades, das autoridades maçônicas
brasileiras poderia dissipar as dúvidas a respeito do relacionamento entre
Maçonaria e Igreja em nosso país.
4. As tentativas de alcançar uma
paz
De modo semelhante ao que acontece
no campo do ecumenismo em sentido estrito, também na questão maçónica houve
algumas tentativas de abertura logo após a Segunda Guerra Mundial, ainda
durante o pontificado de Pio XII. Algumas, de caráter estritamente local, como
os encontros do Cardeal Innitzer com expoentes da Maçonaria austríaca, não
tiveram maior repercussão. Mas houve também algum tímido passo dado pela Santa
Sé. “A partir de 1948, Monsenhor Ronca (Reitor da Basílica Lateranense) manteve
contatos com Raoul Venturini, que voltara recentemente a Roma depois de um
período no exterior para fugir das perseguições fascistas. Ele era Grão-Mestre
da Maçonaria de Rito Escocês Antigo e Aceito e dizia que queria esforçar-se
para anular a censura imposta pela Igreja à Maçonaria”^. Esses primeiros
contatos, realizados por ordem da Santa Sé, não levaram a nenhum resultado
positivo, pois foram interrompidos bastante cedo, por iniciativa do Santo
Ofício.
Durante o Concílio Vaticano II,
alçaram-se vozes, ou, mais exatamente, uma voz, a de D. Sérgio Méndez Arceo,
então Bispo de Cuernavaca, no México, pedindo uma revisão da postura da Igreja
frente à Maçonaria. Em 6 de dezembro de 1962 e em 20 de novembro de 1963, o
Bispo mexicano argumentou, na aula conciliar, em favor de uma aproximação entre
Igreja e Maçonaria; mais especificamente, pediu uma nova atitude pastoral em
face dos maçons, argumentando com a já citada distinção entre Maçonaria regular
e irregular. Mas essas intervenções não tiveram repercussão prática nos
documentos emanados do Concílio.
Mais importantes são as atitudes
que, no imediato pós-concílio, adotaram alguns episcopados. Multiplicaram-se
contatos e estudos e, em diversos lugares, sacerdotes e até Bispos
participaram, sob convite, de “sessões brancas”. Entre nós, por exemplo, D.
Luciano Cabral Duarte, então Bispo auxiliar de Aracaju, pronunciou uma
conferência na Loja Contiguiba, da capital sergipana, no dia 29 de maio de
1969. Três anos mais tarde, o mesmo D. Luciano propõe e consegue um acordo de
cooperação com a mesma Loja: Arquidiocese e Loja compraram conjuntamente uma
fazenda, chamada “da reconciliação”, para o assentamento de camponeses sem
terra. Essa iniciativa valeu para o Arcebispo sergipano a medalha de ouro do
Grande Reconhecimento Maçônico. Por sua vez, D. Avelar Brandão Vilela chegou a
celebrar uma Missa, no Natal de 1975, na Grande Loja Liberdade de Salvador
(402), gesto bastante discutível, por causa do significado central da
Eucaristia para o ser e a unidade da Igreja.
Talvez as ações mais interessantes,
nessas tentativas de reconciliação, tenham sido as dos episcopados da
Escandinávia e das Filipinas. Já em 1964, portanto, em pleno período conciliar,
os Bispos da Noruega permitiram que um convertido ao catolicismo permanecesse,
a título experimental, na Maçonaria, sob a condição de abandonar imediatamente
a Ordem, logo que percebesse qualquer coisa de incompatível com a fé cristã. Na
reunião de 21 a 23 de outubro de 1966, os Bispos de toda a Escandinávia
(Suécia, Noruega, Dinamarca, Finlândia e Islândia) decidiram aplicar a mesma
medida em seus respectivos territórios. Advirta-se, porém, que não se tratava
de permitir que católicos se inscrevessem na Maçonaria, mas apenas de que
convertidos do protestantismo ao catolicismo permanecessem numa Loja à qual
pertenciam já antes da conversão. Ainda mais: isso seria feito caso por caso,
mediante a aplicação do poder de dispensa dos Bispos. Estes, portanto,
reconheciam que continuava em vigor a proibição geral do Código de Direito
Canônico. Não obstante essas nuanças, as interpretações, sobretudo da imprensa
leiga, espalharam a idéia de que não havia mais nenhuma restrição contra a
Maçonaria, da parte da Santa Sé. A Rádio Vaticana reagiu mediante um comunicado
difundido no dia 19 de março de 1968, que terminava secamente: “Pelo competente
dicastério da Santa Sê, fomos autorizados a desmentir tais informações como
carentes de fundamento”.
Nas Filipinas, encontros entre
representantes da Igreja e da Maçonaria levaram a uma série de conclusões que
pareciam mostrar a conciliabilidade entre o ser católico e a adscrição às
Lojas. Essas conclusões, aprovadas pelo Episcopado, durante a reunião de 27 de
janeiro a 10 de fevereiro de 1969, foram subscritas por ambas as partes, no dia
17 de fevereiro do mesmo ano.
Também é digna de ser notada a
admissão do advogado Alec Mellor na Loja Esperança 35, filiada à Grande Loja
Nacional da França, após consulta, por intermédio do Pe. Riquet, ao então Arcebispo
de Paris, Cardeal Marty. O conhecido advogado maçonólogo declarou
explicitamente, em carta a Sua Eminência, que desejava continuar a ser
católico. Por sua vez, o Arcebispo respondeu que não devia formular nem
autorização nem proibição alguma e que o interessado consultasse a sua
consciência. Após a solicitação formal de ingresso na Maçonaria, prossegue Alec
Mellor: “Informei ao Arcebispo, depois esperei que o raio caísse,
eventualmente, sobre a minha cabeça… O raio não caiu”. (10)
Dentro desse quadro de diálogo
incipiente, o Cardeal Kõnig, sucessor de Innitzer no Arcebispado de Viena,
consegue formar uma comissão mista católico-maçônica, que acabou produzindo um
documento conhecido como “Declaração de Lichtenau”, assinada por nove maçons e
três teólogos católicos dos países de língua alemã. Destinado inicialmente
apenas ao Papa Paulo VI e ao Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé,
Cardeal Seper, como uma contribuição para o estudo de ulteriores medidas,
propugnava a abolição das condenações canônicas contra a
Maçonaria.
Não possuía caráter autoritativo: era apenas um parecer respeitável de peritos
de ambas as partes11.
Esses fatos e outros semelhantes
levaram à constituição de um dossiê vaticano sobre a Maçonaria, confiado ao
Secretariado (atualmente, Conselho Pontifício) para os Não-crentes e,
sobretudo, ã Congregação para a Doutrina da Fé. Acumularam-se nele os pareceres
de numerosos peritos e as respostas dadas por algumas Conferências Episcopais
(não parece que todas tenham sido consultadas) a um questionário enviado em 26
de fevereiro de 1968, pela mesma Congregação romana.
5. A Carta de 1974 da Congregação
para a Doutrina da Fé
Como os acontecimentos se
precipitavam, tornava-se necessária uma tomada de posição das instâncias
romanas. Contudo, ainda parecia que seria prematuro publicar uma decisão
definitiva. Por isso, a Congregação para a Doutrina da Fé, aos 19 de julho de
1974, enviou a algumas Conferências Episcopais uma carta sobre a questão que
nos ocupa. Após lembrar as consultas feitas por muitos Bispos acerca da
interpretação do cân. 2.335 do Código de 1917, que impunha a pena de excomunhão
aos católicos que se inscrevessem na Maçonaria, a carta prosseguia:
“Durante o longo exame da questão,
a Santa Sé consultou diversas vezes as Conferencias Episcopais interessadas de
modo particular pelo assunto, a fim de tomar conhecimento mais acurado tanto da
natureza e da atuação da Maçonaria em nossos dias quanto do pensamento dos
Bispos a respeito.
A grande divergência de respostas,
pela qual transparecem as situações diferentes de cada nação, não permitiu à
Santa Sé mudar a legislação vigente, a qual por isto continua em vigor, até que
nova lei canônica seja publicada pela competente Comissão Pontifícia para a
revisão do Direito Canônico.
No entanto, no exame dos casos
particulares, é necessário levar em consideração que a lei penal está sujeita a
interpretação estrita. Por conseguinte, pode-se ensinar e aplicar, com
segurança, a opinião daqueles autores segundo os quais o cânon 2.335 se refere
unicamente aos católicos que dão o nome às associações que de fato conspiram
contra a Igreja.
Em qualquer situação, porém,
continua firme a proibição, aos clérigos, aos Religiosos e aos membros dos
Institutos Seculares, de darem o nome a qualquer associação maçônica”(12).
Como se vê facilmente, pela leitura
do texto transcrito, a nota da Congregação para a Doutrina da Fé era de alcance
muito limitado. Restringia-se à interpretação de um único canôn, o 2.335, sem
tocar em nenhum dos outros que faziam alusões à Maçonaria. Ainda mais; nem
sequer declarava abolida a pena de excomunhão para os que se inscrevessem na
Ordem maçônica; unicamente afirmava que, de acordo com os princípios gerais da
legislação canônica, essa pena nem sempre se aplicava. Isso era possível porque
o citado canôn, contra o que é próprio da lei, dava a razão da sanção imposta.
Ora, não se verificando essa razão (a conspiração de fato), a pena não deveria
ser aplicada. Parece insinuar-se o desejo de uma mudança, mas também
transparecia a insuficiência, para tanto, dos dados recolhidos até o momento.
Por isso, de modo claro, a SCDF declarava que a legislação geral vigente,
relativa à Maçonaria, continuava em vigor, e, para confirmar essa vigência,
lembravam-se as proibições para os clérigos e os membros dos Institutos de vida
consagrada.
6. De 1974 até a publicação do novo
Código de Direito Canônico (1983)
Não faltaram os que viram, na Nota
de 1974, uma porta aberta para que leigos católicos pudessem inscrever-se
livremente na Maçonaria, pelo menos com licença do Bispo diocesano. Os poderes
de dispensa contidos no Motu Próprio De Episcoporum Muneribus (15/06/1966)
pareciam corroborar essa posição. Perante as dúvidas suscitadas, a CNBB,
através de seu Presidente, pediu ulteriores esclarecimentos à SCDF. Eles foram
dados em carta de 26 de fevereiro de 1975 (Prot 272/44), que é citada, na
edição vaticana anotada do Código de 1983, juntamente com a Carta de 1974 e a
Declaração de 1981, como fonte do atual cân. 1374. Nela, afirma-se que, para
verificar se uma associação maçônica conspira contra a Igreja, “seria desejável
(mas certamente não suficiente, nem de se esperar) uma declaração pública por
parte da associação em questão, a qual afirmasse que não entra nos intentos
dela combater a Igreja; parece, entretanto, que se possa dar fé àqueles que,
inscritos há anos na Maçonaria, solicitam espontaneamente a admissão aos
sacramentos, declarando – ‘onerata ipsorum cons-cientia’ – que a associação na
qual estão inscritos, não persegue nem nunca exigiu deles compromissos
contrários à sua reta consciência cristã. Doutra parte, não parece conveniente
que os Bispos, ao menos no atual estado das coisas, façam declarações púbicas
acerca desta ou daquela associação”. Além disso, “a expressão ‘conspirar contra
a Igreja’ pode dizer, de modo geral, que se deve referir a ‘delitos’ contra a
doutrina, as pessoas ou as instituições eclesiásticas; note-se que isso diz
respeito à associação como tal e não a cada membro tomado singularmente” (13).
Havia aqui uma maior abertura em
direção à Maçonaria? Esse parece ser o sentido óbvio. Contudo, mantinha-se uma
atitude de reserva e se pedia aos Bispos que não fizessem declarações públicas
a respeito.
Entretanto,
prosseguiam os trabalhos para uma nova codificação canônica. Entre os
princípios norteadores dela, o nono propugnava uma simplificação drástica do
Direito Penal, contido no livro V do Código de 1917: “Com referência ao direito
de coação, a que a Igreja não pode renunciar, como sociedade externa, visível e
independente, as penas sejam geralmente ferendae sententiae e irrogadas e
remetidas somente no foro externo. As penas latae sententiae reduzam-se a
poucos casos, e somente sejam irrogadas contra crimes gravíssimos”14. Resultava, pois, muito claro que o novo Código
não mais cominaria a excomunhão contra os maçons. Além disso, no seio da
Comissão codificadora, ficou decidido que o novo corpo legal não deveria citar
expressamente a Maçonaria. “Os consultores unanimemente opinavam que não se
deveria estabelecer pena automática (latae sententiae), pois ou se tratava de
incompatibilidade por heresia e, nesse caso, já se encontra incluída no cân.
1.364, ou não, e então não havia por que estabelecer pena tão grave”15. Como se vê, seguindo o raciocínio que já se
esboçava nos documentos anteriores, os consultores não pretendiam entrar no
mérito da possível ação subversiva da Maçonaria; o único que interessava era a heresia.
Aqui pareciam ecoar as palavras da Bula In eminenti: “tamquam de haeresi
vehe-menter suspectos”.
A insistência dos maçons alemães,
após a declaração de Lichtenau, para que se chegasse a uma pacificação
definitiva, num diálogo direto com o episcopado, acabou por gerar resultados
contrários aos por eles desejados. Após seis anos de estudos, aos 12 de maio de
1980, os Bispos alemães publicaram uma Declaração sobre a questão da pertença
de católicos à Maçonaria, concluindo pela inconciliabilidade, pelos seguintes
motivos:
1) embora não exista uma cosmovisão
maçônica determinada, “o relativismo pertence às convicções fundamentais da
Maçonaria”;
2) a possibilidade do conhecimento
objetivo da verdade é negada pela Maçonaria; a relatividade de qualquer verdade
se encontra na base da Maçonaria;
3) a compreensão que os maçons têm
da religião, é relativista: todas as religiões são tentativas concorrentes para
exprimir a verdade última e inatingível de Deus. O próprio conceito maçônico de
uma religião “em que todos os homens coincidem”, implica uma atitude religiosa
relativista;
4) a Maçonaria não admite um
conhecimento objetivo de Deus, no sentido do conceito pessoal do teísmo. 0
“Grande Arquiteto do Universo” é “algo” neutro, indefinido e aberto a qualquer
interpretação;
5) a concepção que a Maçonaria tem
de Deus, não deixa espaço para uma Revelação Divina, tal como é afirmada pela
fé de todos os cristãos;
6) enquanto a tolerância católica é
uma atitude de benevolência em face das pessoas, a tolerância maçónica diz
respeito às ideias, por muito contraditórias que elas possam ser entre si; na
realidade, é mais uma expressão do relativismo;
7) as ações rituais maçônicas
manifestam, nas palavras e nos símbolos, um caráter semelhante ao dos
sacramentos, como se objetivamente produzissem no homem uma certa
transformação;
8) o aperfeiçoamento ético
perseguido como meta última da Maçonaria é absolutizado e isolado da graça
divina, não deixando espaço para a justificação do homem, no sentido cristão;
9) a Maçonaria apresenta aos seus
membros uma exigência de totalidade, que reclama uma pertença a ela na vida e
na morte, o que parece não deixar espaço para a Igreja. (16)
Sem dúvida, para muitas pessoas, o
documento do Episcopado alemão representou uma ducha de água fria nos seus
entusiasmos filo-maçônicos. O problema não se colocava mais na maquinação,
enquanto ação dirigida contra a Igreja, mas nas concepções básicas da
Maçonaria. Ações podem ter um caráter conjuntural; concepções básicas, pelo
contrário, são intrínsecas e não podem ser abandonadas sem deturpar a própria
natureza da instituição. Daí a conclusão dos Bispos alemães: a
inconciliabilidade entre Igreja e Maçonaria aparecia, aos olhos deles, como
algo muito claro. Poderia argumentar-se que o citado documento tinha um alcance
limitado, pois somente se referiria aos grupos maçônicos existentes nos países
de língua alemã. Além disso, deve-se aceitar que o magistério eclesiástico de
um episcopado nacional não tem caráter vinculante para os católicos de todo o
mundo. Contudo, dado o ensinamento tão claro e explícito, fundamentado nos
princípios gerais de toda Maçonaria, não poderia ser desprezado como algo sem
valor algum. Era, pelo menos, um forte toque de atenção contra uma conciliação
apressada entre Igreja e Maçonaria.
É muito provável que essa Nota do
Episcopado alemão tenha servido como fonte de inspiração para um documento
pouco posterior, de âmbito superior e alcance universal: a Declaração da
Congregação para a Doutrina da Fé, de 17 de fevereiro de 1981, “sobre a
disciplina canônica que proíbe, sob pena de excomunhão, que os católicos se
inscrevam na seita maçônica e em outras associações do mesmo gênero”. Dela
selecionamos os seguintes parágrafos:
“Dado que a citada carta (de
19/07/1974), tornada de domínio público, deu margem a interpretações errôneas e
tendenciosas, esta Congregação, sem querer prejudicar as eventuais disposições
do novo Código, confirma e precisa quanto segue:
’1. não foi modificada de algum
modo a disciplina canônica, que permanece em todo o seu vigor;
’2. não foi, portanto, ab-rogada a
excomunhão nem as outras penas canônicas previstas;
’3. quanto na citada carta se
refere à interpretação a ser dada ao cânon em questão, deve ser entendido, como
intencionava a Congregação, só como um apelo aos princípios gerais da
interpretação das leis penais para a solução dos casos de cada pessoa, que
podem ser submetidos ao juízo dos Ordinários. Não era, pelo contrário, intenção
da Congregação confiar às Conferências Episcopais o pronunciar-se publicamente
com um juízo de caráter geral sobre a natureza das associações maçônicas que
implique derrogação das mencionadas normas’ (17).
Encontramos nessa Declaração,
assinada pelo mesmo Card. Seper, que enviou a Carta de 1974, uma desaprovação
explicita de interpretações errôneas e tendenciosas. Quais fossem essas
interpretações, deduz-se muito facilmente do próprio texto: 1) afirmar que a
disciplina canônica (e, portanto, a proibição de católicos se inscreverem na
Maçonaria) teria sido modificada; 2) afirmar que a excomunhão latae sententiae
contra os maçons teria sido ab-rogada, 3) afirmar que as Conferências
Episcopais poderiam dar normas contrárias às existentes em caráter geral. Pelo
contrário, não eram reprovadas as Conferências Episcopais que, como a alemã,
insistiam na incompatibilidade entre Igreja e Maçonaria. No fundo desse
documento, havia o desejo de não tomar medida que pudesse parecer uma
ingerência nas tarefas da Comissão Pontifícia para a revisão do Código de
Direito Canônico. Por isso, evitou-se uma tomada de posição mais explicita.
7. O novo Código de Direito
Canônico e a sua Interpretação oficial
No dia 25 de janeiro de 1983,
exatamente vinte e quatro anos após o primeiro anúncio da reforma, foi
promulgado o novo Código de Direito Canônico. Deveria entrar em vigor no
primeiro domingo do Advento (27 de novembro) do mesmo ano. De acordo com as
previsões e o espírito geral da reforma, já indicados, desapareciam dele a
excomunhão latae sententiae contra os maçons, assim como as proibições de
dar-lhes sepultura eclesiástica, admiti-los como padrinhos de batismo e crisma
etc. Faltava inclusive qualquer referência explicita à Maçonaria. Em lugar do
antigo cânon 2.335, aparecia o novo 1.374:
“Quem se inscreve em alguma
associação que maquina contra a Igreja, seja punido com justa pena; e quem
promove ou dirige uma dessas associações seja punido com interdito”.
A imposição da “justa pena” não era
mais automática, mas ficava à discrição do juiz ou da autoridade administrativa
competente, que, de acordo com o que se dizia na Carta da SCDF de 1974, deveria
aplicá-la apenas se ficasse comprovado que uma determinada associação maquina
de fato conta a Igreja. Quase é supérfluo dizer que os católicos mais
inclinados à Maçonaria viram, nessa redação, como que uma confirmação de suas
afirmações. “Se não está mais penada com excomunhão automática a inscrição na
Maçonaria – argumentavam -, segue-se que é lícito ao católico inscrever-se
nela”. O argumento era completamente falho: muitos atos ilícitos (a começar
pelo homicídio) não estão penados com excomunhão automática; ainda mais, de
acordo com os princípios norteadores da reforma do Direito canônico, o nosso
Código não pretende, com as suas penas, enquadrar todos os atos imorais e
reprováveis.
Como, de fato, essas interpretações
apareceram um pouco por toda a parte, e como, segundo se dizia, havia muitos
católicos esperando a entrada em vigor do novo Código para se inscreverem na
Maçonaria, a Congregação para a Doutrina da Fé – agora sob direção do Cardeal
Ratzinger – viu-se constrangida a intervir mais uma vez no assunto. A 26 de
novembro de 1983, na véspera da entrada em vigor do novo corpo legal, publicou
em L’Osservatore Romano uma “Declaração sobre as associações maçônicas”(18),
com o seguinte teor:
“Foi perguntado se mudou o parecer
da Igreja a respeito da Maçonaria, pelo fato de que no novo Código de Direito
Canônico ela não vem expressamente mencionada como no Código anterior.
Esta Sagrada Congregação quer
responder que tal circunstância é devida a um critério redacional, seguido
também quanto às outras associações igualmente não mencionadas, uma vez que
estão compreendidas em categorias mais amplas.
Permanece portanto imutável o
parecer negativo da Igreja a respeito das associações maçônicas, pois os seus
princípios foram sempre considerados inconciliáveis com a doutrina da Igreja e
por isso permanece proibida a inscrição nelas. Os fiéis que pertencem às
associações maçônicas, estão em estado de pecado grave e não podem aproximar-se
da Sagrada Comunhão.
Não compete às autoridades
eclesiásticas locas pronunciar-se sobre a natureza das associações maçônicas
com um juízo que implique derrogação de quanto acima estabelecido, e isto
segundo a mente da Declaração, desta Sagrada Congregação, de 17 de fevereiro de
1981 (cf. AAS 73, 1981, p. 240-241).
O Sumo Pontífice João Paulo II,
durante a audiência concedida ao subscrito Cardeal Prefeito, aprovou a presente
Declaração, e ordenou a sua publicação”.
Esta declaração revestia-se de uma
solenidade incomum. Contra o que seria lógico, tratando-se da interpretação de
um texto legal, não foi emitida pela correspondente Comissão Pontifícia (o
atual Conselho para a Interpretação dos Textos legislativos), mas pela mais
alta autoridade em questões doutrinárias, a Congregação para a Doutrina da Fé,
com a aprovação, em forma específica, do Santo Padre. Por isso, também a sua
argumentação se situa no plano doutrinário, sem entrar no mérito da questão da
machinatio, declarando a incompatibilidade entre os princípios da Maçonaria e a
doutrina da Igreja Católica. Isso exclui qualquer dispensa, em casos
particulares, pois não se trata de “leis disciplinares”, as únicas passíveis de
dispensa, conforme o cân. 87. Pela mesma razão, as Conferências Episcopais
ficavam proibidas de se pronunciar com um juízo que implique derrogação das
normas dadas. Ficava também claro que não se poderia defender uma suposta
compatibilidade entre Igreja Católica e Maçonaria, com base na omissão da pena
de excomunhão no novo Código.
8. Dois esclarecimentos “oficiosos”
Pouco mais de um ano após a
declaração anterior, a 23 de fevereiro de 1985, apareceram em L’Osservatore
Romano”(19), umas “reflexões” em caracteres itálicos e assinadas apenas com
três asteriscos, com o titulo “Fé Cristã e Maçonaria são inconciliáveis”. É
sabido que L’Osservatore Romano é um jornal oficioso da Santa Sé, e que, como
em toda publicação, os artigos publicados sem assinatura são da
responsabilidade do próprio jornal. Para qualquer um que conheça a praxe
romana, aliás, o tipo itálico e os asteriscos no fim do artigo indicavam
claramente que fora escrito nos ambientes da Congregação para a Doutrina da Fé.
Isso foi inclusive afirmado explicitamente no comunicado da Rádio Vaticano, ao
colocar como titulo da noticia: “Reafirmada pela Congregação para a Doutrina da
Fé a inconciliabilidade entre Fé Cristã e Maçonaria”. Após aludir aos estudos
realizados, o artigo continuava: “Agora o estudo mais aprofundado levou a SCDF
a manter-se na convicção da inconciliabilidade entre os princípios da Maçonaria
e a fé cristã (sublinhado nosso). Prescindindo, portanto, da consideração da
atitude prática das diversas Lojas, de hostilidade ou não para com a Igreja, a
SCDF, com a sua Declaração de 26/11/83, pretendeu colocar-se no nível mais
profundo e, por outro lado, essencial do problema: isto é, sobre o plano da
inconciliabilidade dos princípios, o que significa: no plano da fé e das suas
exigências morais”.
O artigo continuava mostrando que o
relativismo, mesmo não afirmado como verdade dogmática, pertence às convicções
fundamentais da Maçonaria e é veiculado através de um sistema simbólico
extremamente absorvente. Daí a impossibilidade, para o católico, de uma dupla
fidelidade, eclesial e maçônica, ou de uma dupla moralidade, humanista e
cristã.
Saindo também ao passo de críticas
levantadas contra a frase contida na Declaração de 1983, de que os que se
inscrevem na Maçonaria “estão em estado de pecado grave e não podem
aproximar-se da Sagrada Comunhão”, o artigo acrescentava: “Com essa última
expressão, a Sagrada Congregação indica aos fiéis que tal inscrição constitui
objetivamente (sublinhado nosso) um pecado grave e, precisando que os aderentes
a uma associação maçônica não podem aproximar-se da Sagrada Comunhão, ela quer
iluminar a consciência dos fiéis sobre uma grave conseqüência que lhes advém da
sua adesão a uma Loja maçônica”.
Finalmente, reafirmava a proibição
de as Conferências Episcopais se manifestarem sobre a matéria, com juízo que
implique derrogação das normas já dadas em caráter geral.
A continuidade, da parte de alguns
poucos, dos esforços para demonstrar a compatibilidade entre Fé Cristã e
Maçonaria acabou por forçar mais uma intervenção das instâncias romanas. É
sabido que, desde as suas origens, no século passado, a revista La Civiltà
Cattolica é considerada porta-voz oficioso da Santa Sé. De modo especial, os
seus editoriais refletem um pensamento bem próximo da Secretaria de Estado. No
dia 2 de novembro de 1991, um editorial da citada revista tocava mais uma vez
no tema “A Igreja e a Maçonaria hoje” (20). A finalidade desse escrito era
claramente expressa: “Pensamos… que na Maçonaria, enquanto tal, se realiza uma
educação numa filosofia e numa ‘religiosidade’ que a Igreja considera, mesmo
atualmente, incompatível com a reta fé cristã e com a adesão convicta de fé ao
mistério do povo de Deus e ao magistério que vive no seu seio. Queremos
apresentar esta inconciliabilidade essencial, que é, conseqüentemente, a chave
para a compreensão das mais recentes intervenções eclesiásticas sobre a
matéria”. A argumentação em favor de tal inconciliabilidade baseia-se, como já
vimos, na ideologia iluminista, que se encontra no fundo de toda e qualquer
Maçonaria: “Não é por acaso que na Maçonaria se encontram, em todas as
latitudes, duas características do Iluminismo: a confiança absoluta nos poderes
infalíveis da razão e da experiência, e o senso da imensidão da natureza,
governada pelas leis férreas do mecanismo universal, nem sempre favorável ao
homem”. O argumento é desenvolvido longamente, com ricas citações de autores
tanto católicos quanto maçons. O editorial concluía com convicção: “Quem
conheceu a riqueza da doutrina de Cristo e aderiu a ela, de acordo com o
espírito da Tradição cristã, representado cada dia pelo Magistério vivo da
Igreja; quem conhece e vive os esplendores da Liturgia católica e da
espiritualidade cristã; quem, finalmente, concebe a sua vida como desejo de
união com o Deus vivo do Evangelho e como testemunho apostólico para o próximo,
dificilmente será seduzido pela Maçonaria, pela sua doutrina, pelos seus ritos,
pelos seus fins”.
Toda a documentação que
apresentamos até agora, leva logicamente a uma conclusão: Maçonaria e Igreja
Católica são simplesmente inconciliáveis, com uma inconciliabilidade que não
depende de conjunturas históricas nem de ações particulares, mas que é
intrínseca à própria natureza de ambas instituições.
9. E as outras Comunidades cristãs?
Costuma-se argumentar que somente o
Catolicismo, ou mais exatamente, o Papado, se mostra intransigente frente à
Maçonaria. Essa afirmação não é correta. É certo que os pronunciamentos de
outras Comunidades eclesiais a respeito do problema maçônico são muito menos numerosos
do que os da Católica; mas isto é devido, em grande parte, ao fato de somente a
Igreja Católica possuir um magistério central, válido pan o mundo inteiro.
Contudo, cá e lá, surgiram vozes de diversas confissões não católicas afirmando
a incompatibilidade entre pertença à Maçonaria e Fé Cristã. Apresentamos apenas
alguns exemplos documentados.
Paralelamente às conversações da
Maçonaria com a Igreja Católica alemã, desenvolveram-se outras com a Igreja
Evangélica (luterana). A “Comissão Oficial de Diálogo” deixou abertas as portas
para uma filiação dos evangélicos à Maçonaria; contudo, expressou claramente a
sua perplexidade acerca do significado do ritual e das suas repercussões na
vida interior. Da! a questão: “se a influência do ritual na vida interior e no
trabalho do maçom não concorreria p<«ra diminuir, nos cristãos evangélicos,
a justificação pela graça” (21).
A Igreja da Inglaterra
(“Anglicanos”) é conhecida pelas suas estreitas relações com a Maçonaria. O
antigo arcebispo de Cantuária, Fisher, era sabidamente maçom. Mesmo entre nós,
no Brasil, vários dos ministros da Igreja Episcopal, incluindo bispos, são ou
foram maçons. Apesar desses laços históricos, em 1986, uma comissão especial
anglicana de sete membros, incluindo dois maçons, publicou um documento com o
título “Franco-Maçonaria e Cristianismo são incompatíveis?” A conclusão era
claramente afirmativa e baseava-se no caráter pelagiano da concepção maçônica
de aperfeiçoamento e salvação do homem. O Sínodo Geral da Igreja da Inglaterra,
realizado em York, em 1987, aprovou, por 394 votos contra 52 e 5 abstenções, a
declaração de incompatibilidade entre Maçonaria e fé anglicana.
“Em 1985, a Igreja metodista (da
Inglaterra) condenou o sincretismo anticristão da Maçonaria. As Igrejas
evangélicas americanas do Missouri e do Wisconsin já haviam-se pronunciado na
mesma linha em 1967. A Igreja Ortodoxa nunca retificou a declaração contra a
Maçonaria, publicada em 1933″ (22). Também a Igreja Católica Apostólica
Ortodoxa Antioquena mantém, no Brasil, essa atitude.
Conforme um jornal católico da
Holanda (23/05/89), em 20 de maio de 1989, o Sínodo Geral da Igreja
Presbiteriana da Escócia aprovou, por grande maioria, o texto duma circular
dirigida aos membros maçons da Igreja, convidando-os a abandonar a Maçonaria,
por ser ela inconciliável com a fé cristã (23).
As três principais Igrejas
luteranas dos Estados Unidos (American Lutheran Church, Lutheran Church
Missouri Synod, Lutheran Church in America) proíbem que seus pastores pertençam
à Maçonaria; no que respeita aos membros leigos, não há atitude unânime: a LCMS
o proíbe, a ALC o desaconselha, a LCIA o permite (24).
No Brasil, também encontramos
algumas posições antimaçônicas entre as Igrejas evangélicas. A IECLB (Igreja
Evangélica de Confissão Luterana no Brasil) é tradicionalmente contrária à
pertença de seus membros à Maçonaria; embora não tenha dado uma proibição
formal nesse sentido, claramente desaconselha aos pastores a inscrição nas
Lojas.
Num
recente documento, aprovado pelo Conselho Diretor, em abril de 1991 (“A IECLB e
a Maçonaria – uma palavra de orientação”. IECLEB n9 4799/91), embora tentando evitar
qualquer atitude polêmica, afirma-se: “São flagrantes as diferenças (da
maçonaria) com relação ao credo cristão. Dizem respeito tanto ao conceito de Deus
quanto ao de Jesus Cristo e ao da salvação do ser humano. Sob a perspectiva
luterana, a Maçonaria deve ser qualificada como ‘legalista’ por excluir a graça
divina como o fator decisivo da salvação. Tanto o solus Christus,
quanto o sola gratia não
têm correspondência na concepção maçônica… Não há, pois, como negar as
diferenças”.
Mas onde mais viva se apresentou a
questão maçônica entre os protestantes brasileiros foi a formação da Igreja
Presbiteriana Independente (IPI). Eduardo Carlos Pereira, que liderava um grupo
de tendências nacionalistas dentro da Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB),
frente aos missionários norte-americanos, apresentou esse ponto como uma
questão de consciência. O Sínodo da IPB, de 1900, negou-se a tomar qualquer
atitude contra a Maçonaria. Pereira, que, por outros motivos, já se encontrava
em conflito com alguns setores da IPB, preparou então, para o Sínodo de 1903,
uma “Plataforma”, afirmando a incompatibilidade do ser evangélico com a
Maçonaria (25). Após violentas discussões, o Sínodo se negou a endossar as
posições de Pereira. Este reagiu retirando-se do Sínodo e declarando: “A
Maçonaria cavou um abismo entre nós e vós”. Surgiu assim a IPI, que até o dia
de hoje mantém uma atitude firmemente antimaçônica. Pouco tempo depois, “a
Assembléia Geral da Igreja Presbiteriana (do Brasil, ou IPB), reunida em Valença
(Rio de Janeiro), em 1916, declarou que esta Igreja jamais reconheceu e não
reconhece a compatibilidade da Maçonaria e da profissão do Evangelho. Quanto ao
passado, era uma questão de palavras: o Sínodo de 1903, na verdade, se havia
recusado a decidir sobre essa incompatibilidade, muito embora os seus lideres
se houvessem esforçado por prová-la. E, a partir de então até os nossos dias,
toda a atenção da Igreja Presbiteriana (do Brasil) foi no sentido de que a
questão maçônica não fosse novamente proposta.” (26)
Não tenho notícias em relação à
posição das outras Igrejas evangélicas brasileiras na questão maçônica.
Certamente, existem numerosos pastores maçons na Igreja metodista e na
episcopal (Comunhão anglicana). Como também há alguns que sustentam posições
claramente anti-maçônicas. Faltam, porém, pronunciamentos oficiais das Igrejas.
O Pe. Jesús Hortal S. J. é doutor em Direito Canônico, Vice-Reitor
Acadêmico da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e Professor do
Instituto de Direito Canônico da Arquidiocese do Rio de Janeiro. – O presente
artigo foi publicado na revista “Direto e Pastorar, ano VI, nos. 23-24,
janeiro-abril de 1992. pp. 58-81 (Caixa Postal 1362, 20001-970 Rio de Janeiro –
RJ).
NOTAS
1)
MELLOR, Alec, Os Grandes Problemas da atual Franco-Maçonaria, São Paulo, 1976,
Editora Pensamento, p. 44.
2)
BENIMELI, F. – CAPRILE, G. – ALBERTON, V^ Maçonaria e Igreja Católica. Ontem,
Hoje e Amanhã, São Paulo 1983, Edições Paulinas, p. 28, nota. 9.
3)
Utilizo a tradução de Fr. BOAVENTURA KLOPPENBURG, em seu livro A Maçonaria no
Brasil Petrópolis 1961, Editora Vozes, p. 319.
3a)
Excomunhão latae sententiae é a pena que decorre da prática mesma do delito,
não sendo necessário qualquer processo ou julgamento que lavre a sentença
condenatória. A excomunhão proferida após julgamento é dita ferendae
sententiae.
4)
Denzinger-Schònmetzer, Enchirídion Symbolorum. . . (Enquirídio de Símbolos e
Definições de Fé) no2513.
5) REGATILLO, E. F„
Institutiones luris Canonici, vol. II7. Santander,
1963, Sal Terrae, p. 590.
6)
MELLOR, Alec, Os Grandes problemas da atual Franco-Maçonaria. Os novos rumos da
Franco-Maçonaria, São Paulo, s/a, Editora Pensamento, p. 162.
7)
Ibid.p. 10.
8)
Citado por Joseph STIMPFLE, na revista “30 Giomi” (ed. brasileira), nov. 1986,
p. 50.
9)
Carta de Cláudio Righi, publicada em “30 Dias” (ed. brasileira), mar. 1992,
p.6.
10)
MELLOR, 4, a a, pp. 62-63.
11)
Pode-se ver o texto completo em ALBERTON e outros, o.a, pp. 310-313.
12)
Utilizamos a tradução publicada pela CNBB no boletim semanal de Notícias,
n, 230, de 23 de agosto de 1974, e no Comunicado Mensal A nota da SCDF não foi
publicada em Acta ApostoScae Sedis, por estar dirigida “a algumas Conferências
Episcopais” e não ter, por isso, caráter de lei geral.
13)
Em Comunicado Mensal da CNBB, ru 270, mar. 1975.
14)
Prefácio romano (sem nome do autor) ao Código de Direito Canônico; na ed.
brasileira, p. XXIX.
15)
Cf. PINERO CARRION, J. M-„ La Ley de la Iglesia, voL II, Madri 1985, S.E.
Atenas, p. 411, citando a ata do correspondente grupo de trabalho, publicada em
Communicationes 16 (1984) 48-49.
16)
O texto alemão de Declaração pode ser visto no jornal Deutsche
Ta-gespost, de 23-25/105/1980, e em Herder Korrespondenz de junho de 1980. Uma
tradução portuguesa foi incluída no livro de BENIMELI, CAPRILE e ALBERTON
repetidamente citado, pp. 140-150.
17)
AAS 73 (1981) 240-241; texto português em L’Osservatore Romano (ed. port.) de
08/03/1981; republicado em Comunicado Mensal da CNBB, 31 de março de 1985, p.
142.
18)
AAS 76 (1984) 300. O texto apareceu originalmente em L’Osservatore Romano do
citado dia.
19)
A tradução portuguesa apareceu na correspondente edição semanal do dia 10 de
março do mesmo ano, p. (115).
20)
‘La Chiesa e la Massoneria oggí’, em La Civiltà Cattolica, 1991, vol. IV, pp.
217-227.
21)
STIMPFLE, Joseph, “A Impossível Coabitação”, em 30 Giorni, ed. bras.,
nov. 1986, p. 54.
22)
VALENTE, Gianni, “Assim é se eles querem”, em 30 dias, mar. 1992, p. 39.
(23)
Notícias fornecidas por Fr. Félix Neefjs, OFM, no VII encontro de
reflexão sobre a Maçonaria (26/06/89).
(24)
Informação fornecida pelo Pr. Armindo Mueller, conforme carta do Pr. Jack
L. Torgersen, no 4- Encontro de Reflexão sobre a Maçonaria (05/12/87).
(25)
O texto completo pode ver-se em: REILL Y, Duncan A., História Documental
do Protestantismo no Brasil, São Paulo 1984, ASTE, p. 166-168.
(26)
LEONARD, Emile-G., O Protestantismo Brasileiro. Estudo de Eclesiologia e
História Social, Rio de Janeiro 1963, JUERP-ASTE, p. 60-161.
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