viernes, 27 de julio de 2012

Dogmas marianos da Igreja Católica


Dogmas marianos da Igreja Católica

     Os Dogmas e as doutrinas marianas da Igreja Católica têm a sua fundação na visão central de que a Virgem Maria é a Mãe de Deus, devido a isso, a Igreja Católica sempre considerou Maria a figura mais importante do cristianismo e da salvação depois de Jesus Cristo e a Santíssima Trindade, por conseguinte, a Igreja possui muitos ensinamentos e doutrinas em relação a sua vida e papel.
     A Igreja Católica possuí uma disciplina específica para o estudo da pessoa, o papel e o significado da Virgem Maria, e sua veneração, esta é a disciplina da Mariologia. A doutrina mariana tem se desenvolvido ao longo de muitos séculos, e foi estudada e codificada pelos Concílios, bem como pelos principais teólogos das ordens religiosas e universidades marianas, Escolas Pontifícias, como a Marianum que são especificamente dedicadas a este campo de estudo[1][2][3]. No entanto, revelações marianas por indivíduos nem sempre são aceitos pela Igreja. [4][5]

Ensinamentos dogmáticos da Igreja Católica

     Segundo a doutrina da Igreja Católica, Maria está associada aos seguintes dogmas de fé:
1- Virgindade Perpétua - Virgem antes, durante e depois do parto.
2- Maternidade Divina - Maria é mãe de Deus. Porque se Jesus é Deus e Maria é mãe de Jesus, logo Maria é mãe de Deus.
3- Imaculada Conceição – Concebida sem a mancha do pecado original. O Papa Pio IX, na Bula Ineffabilis Deus, fez a definição oficial do dogma da Imaculada Conceição, aos 8 de Dezembro de 1854.
4- Assunção aos Céus – Refere-se à elevação de Maria em corpo e alma ao Céu. Este dogma foi proclamado pelo Papa Pio XII em 1 de Novembro de 1950, na encíclica Munificentissimus Deus.
     As igrejas ortodoxas e anglicanas na sua maioria aceitam alguns desses dogmas. Os Ortodoxos aceitam o dogma da Virgindade Perpétua e referem-se a Maria como Theotokos. Alguns Anglicanos aceitam referir a Maria como Theotokos. A Igreja do Oriente, uma das mais antigas denominações cristãs, rejeita chamá-la de Theotokos. As confissões protestantes não os aceitam ou mostram-se reticentes sobre o tema.

1-Virgindade Perpétua

     A Perpétua Virgindade de Maria ensina que Maria é virgem antes, durante e depois do parto. Este dogma mariano é o mais antigo da Igreja Católica e Oriental Ortodoxa, que afirma a "real e perpétua virgindade mesmo no ato de dar à luz o Filho de Deus feito homem."[6] Assim Maria foi sempre Virgem pelo resto de sua vida, sendo o nascimento de Jesus como seu filho biológico, uma concepção milagrosa.
     No ano 107, Inácio de Antioquia já descrevia a virgindade de Maria. São Tomás de Aquino também ensinou esta doutrina (Summa theologiae III.28.2) que Maria deu o nascimento miraculoso sem abertura do útero, e sem prejuízo para o hímen. Esta doutrina já era um dogma desde o cristianismo primitivo, tendo sido declarada por notáveis escritores como São Justino Mártir e Orígenes. O Papa Paulo IV o reconfirmou no Cum quorundam de 7 de Agosto de 1555, no Concílio de Trento.

2-Maternidade Divina

     A definição como Mater Dei (em latim) ou Theotokos (em grego) foi afirmado por diversos Padres da Igreja nos três primeiros séculos, como Inácio (107), Orígenes (254), Atanásio (330) e João Crisóstomo (400). O Terceiro Concílio Ecumênico, realizado em Éfeso decretou esta doutrina dogmaticamente em 431. A visão contrária, defendida pelo patriarca de Constantinopla Nestório era que Maria devia ser chamada de Christotokos, que significa "Mãe de Cristo", para restringir o seu papel como mãe apenas da natureza humana de Cristo e não da sua natureza divina.
     Os adversários de Nestório, liderados por Cirilo de Alexandria, consideravam isto inaceitável, pois Nestório estava destruindo a união perfeita e inseparável da natureza divina e humana em Jesus Cristo, uma vez que em Cristo "O Verbo se fez carne" (João 1:14), ou seja o Verbo (que é Deus - João 1:1) é a carne; e a carne é o Verbo, Maria foi a mãe da carne de Cristo e consequentemente do Verbo. Cirilo escreveu que "Surpreende-me que há alguns que duvidam que a Virgem santa deve ser chamada ou não de Theotokos. Pois, se nosso Senhor Jesus Cristo é Deus, e a Virgem santa deu-o à luz, ela não se tornou a Theotokos?"[7] A doutrina de Nestório foi considerada uma falsificação da Encarnação de Cristo, e por conseqüencia, da salvação da humanidade. O Concílio aceitou a argumentação de Cirilo, afirmou como dogma o título de Theotókos de Maria, e anamatizou Nestório, considerando sua doutrina (Nestorianismo) como uma heresia.

3-Imaculada Conceição

     Na bula papal dogmática Ineffabilis Deus, foi feita a definição oficial do dogma da Imaculada Conceição; nela, em 8 de dezembro de 1854 disse Pio IX: (...) que a doutrina que defende que a beatíssima Virgem Maria foi preservada de toda a mancha do pecado original desde o primeiro instante da sua concepção, por singular graça de privilégio de Deus omnipotente e em atenção aos merecimentos de Jesus Cristo salvador do gênero humano, foi revelada por Deus e que, por isso deve ser admitida com fé firme e constante por todos os fiéis. [8]
     Em 8 de setembro de 1953, Pio XII através da Carta encíclica Fulgens corona anunciou a celebração do "Ano Mariano" comemorativo do primeiro centenário da definição do dogma da "Imaculada Conceição da Bem-aventurada Virgem Maria". Em 5 de dezembro de 2007, Bento XVI fez tornar público decreto que concede indulgência plenária aos fiéis que cumprirem as condições nele estabelecidas, por ocasião do "150º. aniversário da manifestação da Beata Virgem Maria na Gruta de Massabielle, próximo a Lourdes"[9]
     A New Catholic Encyclopedia (1967, Vol. VII, pp. 378-381) reconhece com respeito à origem dessa crença: “. . . a Imaculada Conceição não é ensinada explicitamente nas Escrituras . . . Os mais primitivos Pais da Igreja consideravam Maria como santa, mas não absolutamente sem pecado. . . . É impossível precisar uma data quando essa crença se tornou um artigo de fé, mas, parece que, por volta do 8.° e do 9.° século, se tornou de aceitação geral. . . . [Em 1854, o Papa Pio IX definiu o dogma] ‘que sustenta que a Santíssima Virgem Maria foi preservada de toda a mácula do pecado original no primeiro instante de sua Conceição’.” Esta crença foi confirmada pelo II Concílio do Vaticano (1962-1965). [10]

4-Assunção da Virgem Maria

     A Virgem Maria no fim de sua vida terrena foi elevada em corpo e alma à glória celestial. Este dogma foi proclamado ex cathedra pelo Papa Pio XII, no dia 1º de novembro de 1950, por meio da Constituição Munificentissimus Deus:
     "Depois de elevar a Deus muitas e reiteradas preces e de invocar a luz do Espírito da Verdade, para glória de Deus onipotente, que outorgou à Virgem Maria sua peculiar benevolência; para honra do seu Filho, Rei imortal dos séculos e vencedor do pecado e da morte; para aumentar a glória da mesma augusta Mãe e para gozo e alegria de toda a Igreja, com a autoridade de nosso Senhor Jesus Cristo, dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo e com a nossa, pronunciamos, declaramos e definimos ser dogma divinamente revelado que a Imaculada Mãe de Deus e sempre Virgem Maria, terminado o curso da sua vida terrena, foi assunta em corpo e alma à glória do céu".
     O Papa Pio XII deixou liberadamente em aberto se Maria foi elevada aos céus após sua morte ou ainda em vida.

       São os seguintes, os principais documentos mariológicos da Igreja promulgados nos últimos cento e cinquenta anos:

Papa Leão XIII: Encíclicas Magnae Dei Matris, 1892, Adiutricem populi, 1895, Augustissimae Virginis Mariae, 1897.
Papa Pio IX: Bula dogmática Ineffabilis Deus, de 8 de dezembro de 1854.
Papa Pio X: Encíclia Ad diem illum laetissimum, 1904
Papa Pio XI: Encíclica Lux veritatis, 1931.
Papa Pio XII: Constituição Apostólica Munificentissimus Deus, 1950, encíclicas Fulgens corona, 1953 e Ad Caeli Reginam, 1954.
Concílio Vaticano II, Constituição Lumen Gentium, cap. VIII, 1964.
Papa Paulo VI: Exortações Apostólicas Marialis cultus, 1974 e Signum magnum, 1967.
Papa João Paulo II: Encíclica Redentoris Mater (1987), Exortação Apostólica Redentoris custos, 1989 e Carta Apostólica Rosarium Virginis Mariae, (2002).

Referências

1.↑ Mariology Society of America
2.↑ Centers of Marian Study
3.↑ Publisher’s Notice in the Second Italian Edition (1986), reprinted in English Edition, Gabriel Roschini, O.S.M. (1989). The Virgin Mary in the Writings of Maria Valtorta(English Edition). Kolbe's Publication Inc. ISBN 2-920285-08-4
4.↑ E. Campagna, Maria nel culto cattolico, Torino, 1944
5.↑ Cl. Dillenschneider, Le Mystere de Notre Dame et notre devotion mariale Paris, 1962
6.↑ Catechism of the Catholic Church §499
7.↑ Epístola 1, aos monges do Egito, Patrologia Graeca; 77:13 B
8.↑ "Dogma da Imaculada Conceição" Bula "Ineffabilis Deus" online, 02/12/2007 às 23:03h.
9.↑ "In occasione del 150° anniversario della manifestazione della Beata Vergine Maria nella Grotta di Massabielle, vicino a Lourdes, è quotidianamente concessa l’Indulgenza plenaria ai fedeli, che, dal giorno 8 Dicembre 2007 fino al giorno 8 Dicembre 2008, piamente e alle condizioni stabilite, visiteranno la Grotta di Massabielle, e, dal 2 all’11 Febbraio 2008, visiteranno, in qualsiasi tempio, oratorio, grotta, o luogo decoroso, l’immagine benedetta della Beata Vergine Maria di Lourdes solennemente esposta alla pubblica venerazione" Decreto de Indulgência Plenária (em italiano)
10.↑ The Documents of Vatican II (Nova Iorque, 1966), editado pelo jesuíta W. M. Abbott, p. 88.

Índole pastoral do Vaticano II: uma avaliação.


     Com a generosa contribuição de Gederson Falcometa - Era uma vez a ave Fênix. Todo mundo falava dela, mas nunca ninguém a havia visto. E hoje há uma versão suaaggiornata, da qual todos também falam e ninguém sabe dizer do que se trata: chama-se Pastoral.
1 - A Palavra – Sejamos bem claros: a palavra em si não é um problema, sendo evidente a sua derivação de pascere:verbo que vem do latim pabulum (pasto, alimento), da qual surge uma família não muito numerosa, mas bem identificável em seus componentes: pascere, precisamente, no sentido de conduzir à pastagem e dar de comer; pastum, do qual uma clara tradução é o italiano pasto [alimento, comida], mas que também pode se traduzir com cibo [pasto, comida] ; pastor, indicando que conduz ao pabulum, dá alimento e mantém rebanhos e manadas. Pastor se torna, por sua vez, o pai de pastoricia ars, em italiano pastorizia, ou a arte de quem cria animais; de pastura, com o significado de pasto aberto, e de pastu -- ou pastoral, já presente no latim tardio para descrever o “vestuário, os alimentos, os costumes, a linguagem do pastor. Não descende, todavia, a pasteurização, ou procedimento de conservação de elementos líquidos, como o leite, porque a palavra vem do francês pastoriser, derivando por sua vez de L. Pasteur (1822-1895), seu inventor.
[...] [O termo] Pastoral entrou cedo no jargão eclesiástico, para qualificar três das cartas paulinas, ou a atividade dos evangelistas e de seu ensino, ou as insígnias episcopais, como o anel, o báculo, as cartas. Mais recente, mas não moderno, é o uso de pastoral em referência à teologia e com abordagem não-dogmática; originalmente, de fato, foi anti-dogmático. Aos que desconhecem o jargão eclesiástico, no entanto, um homem da média cultura muito facilmente associará pastoral à mocinha da poesia arcádica, à composição poética de origem provençal e de conteúdo amoroso, à écloga virgiliana, à tragédia "Aminta" de T. Tasso e à música de caráter simples e terno, com específica tipificação na “sexta” de Beethoven.
2 - O termo no Vaticano II - Depois de um espectro semântico de tal amplitude, a alusão à desconhecida e invisível ave fênix poderia parecer insustentável por evidente contradição. A não ser que o condicional “poderia” esteja neutralizado pela ausência, nos documentos conciliares, de uma razão suficiente que o justifique. Digo “razão suficiente”, porque se dissesse que nos documentos conciliares está ausente a “palavra”, daria demonstração de uma ignorância crassa e imperdoável do Vaticano II. A “palavra” não só existe, mas é abundante; na realidade, caracteriza o Vaticano II em sua especificidade de Concílio ecumênico diante dos vinte Concílios que o precedem. O Vaticano II fala, de fato, de ação pastoral em gênero, e mais diretamente deatividades pastorais;  identifica várias necessidades pastorais e, diante delas, pede a instituição e a recíproca colaboração de vários subsídios pastorais, não deixando de assinalar entre estes o planejamento e organização de “cursos, congressos, centros com bibliotecas conexas destinadas aos estudos pastorais, a serem confiados a pessoas altamente capazes”. A fim de expandir no mais amplo raio possível asensibilidade pastoral e os conhecimentos conveninentes, o Vaticano II obriga os bispos a “estudar isoladamente ou em nível interdiocesano o melhor sistema” que assegure aos presbíteros, “sobretudo alguns anos após sua ordenação”, o adequado aprofundamento dos métodos pastorais. Dado que uma forte contribuição para a ação apostólica da Igreja pode vir também dos leigos, o Concílio convida aos bispos a escolher “sacerdotes dotados das qualidades necessárias e convenientemente formados”, que, por sua vez, dêem uma formação adequada aos leigos para então confiar suas especiais tarefas de ação pastoral. E porque “a unidade de propósito entre padres e Bispo torna sempre mais fecunda sua atividade pastoral”, encoraja-se uma periódica reunião do clero, estendida também a outros membros do organismo eclesial, “para tratar de questões pastorais”.
Às Conferências Episcopais de cada nação, recomenda-se calorosamente a atenção e promoção da formação pastoral do clero mediante “institutos pastorais em colaboração com paróquias oportunamente escolhidas, congressos periódicos, exercícios apropriados”. Não se podia evitar um chamado à “competente autoridade eclesiástica territorial” para o estabelecimento de um instituto “de pastoral litúrgica” que se valha de “especialistas em liturgia, música, arte sacra e pastoral”.
Estes dados demostram que a ave fênix está em casa no Vaticano II, mas o Vaticano II não disse o que é ou quem ela é.
Aquele que “governa e apascenta o povo de Deus” é, ademais, instigado a encarnar o Bom Pastor “que dá a vida por suas ovelhas (Jo 10:11)” e a seguir "o exemplo daqueles padres que também em nosso tempo não hesitaram a sacrificar-se a si mesmos pelo próprio rebanho”. Em suma, ao exortar o clero a se fazer dia após dia instrumento de um serviço sempre mais idôneo para o povo de Deus, o Vaticano II declara explicitamente que a sua finalidade pastoral se compromete com “uma renovação interna da Igreja, a difusão do evangelho em todo o mundo e no estabelecimento de uma relação dialógica com este”. Uma tal finalidade corresponde, evidentemente, a uma ideia de fundo, a uma noção de pastoral ao menos rudimentar e tão logo ofuscada: relação dialógica com o mundo da parte de uma Igreja renovada em seus métodos de evangelização e de apostolado. Aqui, um pouco vagamente, a ave fênix começa a se fazer conhecida.
Tal e tamanha insistência não surpreende. É, antes, um sinal de docilidade e fidelidade às linhas mestras que o Papa Roncalli, em 11 de outubro de 1962, apresentou aos Padres abrindo oficialmente a grande Assembléia conciliar: ao colocar a doutrina em primeiro lugar nos trabalhos conciliares, diversificou sua metodologia com relação ao passado. Antes, a Igreja não evitava a condenação, severa e firme. Hoje, à severidade prefere o remédio da misericórdia. Para o Papa Roncalli, então, especialmente diante de uma humanidade presa a tantas dificuldades, a Igreja deveria mostrar o rosto bom, benévolo, paciente da Mãe, fomentar a promoção humana expandindo os espaços da caridade, difundir a serenidade, paz, harmonia e amor. Desta forma, as características da ave fênix, embora permanencendo ainda indefinidas, se confundem com as da mãe paciente e boa.
Confirmando a orientação de Roncalli, o Papa Paulo VI, na homilia de 07 de dezembro de 1965, por ocasião da nona sessão do Concílio, declarou que a Igreja traz em seu coração, junto com o reino dos céus, o homem e o mundo, e mais, está toda a serviço do homem e do mundo, sendo íntima a ligação entre a religião católica e a vida humana, a ponto que a religião católica pode se dizer a própria vida do homem e do gênero humano graças à sua sublimedoutrina, ao cuidado materno com que acompanha o homem ao seu fim último e aos meios que lhes dá para que possam alcançá-lo.Enésima declaração de propósitos pastorais que, mantendo-se dentro dos limites do genérico, ainda não revelam o rosto ou as feições da ave fênix. 

No entanto, não há nenhuma dúvida e nenhuma discussão sobre a pastoralidade do Concílio. O Vaticano II não foi, apenas porque não deveria sê-lo, um Concílio dogmático e, considerando tudo, nem mesmo disciplinar. Quis apenas ser pastoral. E mesmo assim, apesar das muitas intervenções internas e externas, o verdadeiro significado de sua declarada pastoralidade ainda está debaixo de um nevoeiro.
3 – Um conceito não definido – Pouco acima, indiquei as facetas da pastoralidade conciliar. A pastoral como adjetivo qualificativo ou como adjetivo substantivado dá, na verdade, dezenas e dezenas de voltas. Nenhuma, porém, para lhes dar, senão a definição, ao menos um indício de explicação. Reconheço que, analisando criticamente as diversas declarações, é possível ter uma vaga idéia; mas, no entanto, não seria uma expressão direta do ensinamento conciliar.
O exemplo mais probatório é dado pela Gaudium et Spes, qualificada como “Constituição Pastoral”, sendo inteiramente um fermento intelectual e proativo em favor do homem, da sua liberdade e dignidade, da sua presença na família, na sociedade, na cultura e no mundo, com o objetivo de conferir à vida privada e pública um sopro e uma dimensão à medida do homem. A união das duas palavras-chaves – Constituição Pastoral – é a mais recente novidade de todo o Vaticano II; o foi para os próprios Padres conciliares que, antes de aprová-la, discutiram várias outras denominações. A única justificativa para a união está na nota que acompanha o incomum documento, definido como “pastoral” seja porque, “baseado em princípios doutrinais, pretende apresentar a atitude da Igreja em relação ao “mundo e aos homens de hoje”, ou porque atitude e princípios doutrinais permeiam um ao outro. Se deveria inferir que a atitude em questão é sempre a aplicação e a tradução prática dos princípios doutrinários. Mas permanece um problema, a descobrir a origem: talvez dos princípios sociológicos, políticos, econômicos, mas, pelo menos diretamente, não dos princípios evangélicos.
A referência ao homem e ao mundo recorda de ambos a finitude original, a condição de criaturas, a temporalidade, o dinamismo, o constante evoluir, sobre o quais paira a espada de Dâmocles de uma sempre possível involução. Isto evidencia suas condições variáveis e contingentes, mas também a problematicidade da aplicação prática desses princípios doutrinais que são em grande parte absolutos irreformáveis.
Também a nota adverte uma tal aporia e a assinala; mas não a resolve. Antes, a complica no exato momento no qual estabelece que “a Constituição deverá ser interpretada segundo as normas gerais da hermenêutica teológica, tendo em conta... as circunstâncias mutáveis intrinsecamente conexas às matérias tratadas”. Na realidade, se a pastoral devesse consistir nesse balé de dizer sim-e-não, uma definição sua seria impossível. Diz-se que ao contingente vai aplicada a indiscutibilidade da doutrina; mas se essa aplicação reduzisse a doutrina à contingência, ou tornasse indiscutível e absoluto o contingente, perverteria um e outro elemento: o sim de mãos dadas com o não. Compreendo porque, já na Aula conciliar, Gaudium et Spes foi o texto mais discutido e mais obstaculizado, para o qual pouco valeu a sua designação a comissões e subcomissões, como também a passagem por bem quatro reformulações: a dificuldade, para chegarmos no limite da presunção, está na afirmação simultânea do sim e do não.
E talvez dependesse desta aporia não resolvida a problemática que ainda acompanha, após cerca de meio século de pós-concílio, todo discurso sobre a pastoral. Na prática, ela serve para legitimar um pouco de tudo e o seu próprio contrário. As duas hermenêuticas conciliares, as quais frequentemente se referiu a análise do Santo Padre, aquela que faz do Vaticano II o início de um novo modo de ser Igreja e aquela que, pelo contrário, o conecta à Tradição eclesial vivente, são ambas legitimadas pela aporia não resolvida. Nas duas hermenêuticas, na realidade, o Vaticano II:
  1. assume, no âmbito doutrinário, a aparência e o valor de um Concílio dogmático: uma [corrente] faz dele um super Concílio, enquanto a outra faz dele a síntese doutrinal de todos os concílios precedentes;
  2. no âmbito pastoral, ele surge como um recipiente sem diferenciação pela sua própria qualidade de pastoral, uma espécie de “franco atirador” ao qual, por razões pastorais, é concedido dizer simultaneamente o sim e o não.
Se impõe, sobre este ponto, um juízo sereno e objetivo sobre a qualidade geral do Vaticano II, que apressada e ingenuamente foi encerrado na área pastoral.
4 – Os quatro níveis do Vaticano II – Quem tem familiaridade não só com a Gaudium et Spes, mas com todos os dezesseis documentos conciliares, tem consciência de que a variedade temática e a co-respectiva metodologia colocam o Vaticano II sobre quatro níveis, qualitativamente distintos:
  1. o genérico, do Concílio ecumênico enquanto Concílio ecumênico;
  2. o específico, do âmbito pastoral;
  3. o nível do evocar outros Concílios;
  4. e os das inovações.
No âmbito genérico, o Vaticano II satisfaz todas as condições para ser um autêntico Concílio da Igreja Católica; o 21º da série. Provém dele um magistério conciliar, isto é, supremo e solene. O que, por si mesmo, não depõe pela dogmaticidade e infalibilidade de suas assertivas; antes, nem mesmo a comporta, tendo, de início, afastado-a de seu próprio horizonte.
No âmbito especifico, a qualificação de pastoral lhe justifica os vastíssimos interesses, dos quais não poucos excedem o âmbito da Fé e da teologia: por exemplo, a comunicação social, a tecnologia, o eficientismo da sociedade contemporânea, a política, a paz, a guerra, a vida econômico-social. Mesmo este nível pertence ao ensinamento conciliar e é, então, supremo e solene, mas não pode reivindicar, pela matéria tratada e pelo modo não dogmático de tratá-la, uma validade por si infalível e irreformável.
A evocação de alguns ensinamentos dos Concílios precedentes constituem o terceiro nível. É uma evocação por vezes direta e explícita (LG 1: “praecedentium Conciliorum argumento instans”; LG 18: “Concili Vaticani primi vestigia premens”; DV 1: “Conciliorum Tridentini et Vaticani I inhaerens vestigis”), por vezes indireta e implícita, que recorda a verdade já definida: por exemplo, a natureza da Igreja, a sua estrutura hierárquica, a sucessão apostólica, a jurisdição universal do Papa, a encarnação do Verbo, a redenção, a infalibilidade da Igreja e do magistério eclesiástico, a vida eterna dos bons e a eterna condenação dos maus. Sob este aspecto, o Vaticano II goza de uma incontestável validade dogmática, sem ser por isso um Concílio dogmático, sendo sua uma dogmaticidade de reflexo, própria dos textos conciliares citados.
As inovações constituem o quarto nível. Se olharmos para o espírito que guiou o Concílio, seria possível afirmar que o Vaticano II foi todo ele um quarto nível, animado como era de um espírito radicalmente inovador, mesmo onde buscava o seu enraizamento na Tradição. Algumas inovações são, porém, específicas: a colegialidade dos bispos, o absorvimento da Tradição na Sagrada Escritura, a limitação da inspiração e inerrância bíblica, as estranhas relações com o mundo hebraico e islâmico, o irromper da assim chamada liberdade religiosa. Por fim, é muito claro que, se existe um nível ao qual a qualidade dogmática absolutamente não é reconhecível, é propriamente este das novidades conciliares.
5 – Conclusão – A adesão ao Vaticano II é, pelo acima exposto, qualitativamente distinta. Enquanto todos os quatro descritos níveis exprimem um magistério conciliar, todos os quatro colocam ao individuo e à comunidade cristã-católica o dever de uma adesão que não necessariamente será sempre “de Fé”. Esta só vale para as verdades do terceiro nível e apenas enquanto provêm de outros Concílios, seguramente dogmáticos. Aos outros três níveis, é necessário reservar uma religiosa e respeitosa acolhida, até que qualquer uma de suas assertivas não se choque contra a perene atualidade da Tradição por evidente ruptura com o “eodem sensu eademque sententia” de qualquer variante formal sua. O dissenso neste caso, particularmente quando sereno e fundamentado, não caracteriza nem heresia, nem erro. Quanto ao segundo nível, aquele pastoral, como observei na nota n.19, é necessário pensar que os Padres conciliares não conheceram a hipoteca iluminista paga por eles mesmos com a abertura do Concílio a uma pastoral que, desde o começo, segundo a lógica iluminista da qual dependia, havia expulsado a Deus para substituí-lo pelo homem e por vezes para identificar no homem o próprio Deus. Foi, de fato, a pastoral do século XVIII quem deu as costas para as motivações, as fontes, os conteúdos e o método da teologia dogmática. E para abrir as portas da fortaleza teológica ao primado do natural, do racional, do temporal e do sociológico.
Com isto não digo, absolutamente, que a pastoral do Vaticano II seja a mesma pastoral do século XVIII. Mas seria ingênuo ou desinformado quem, para não afirmar-lhe a identidade, negasse todo o seu parentesco. Também no Vaticano II a matriz da pastoral permaneceu aquela iluminista, embora diversamente expressa e motivada. Coube a Paulo VI retirá-la da areia movediça do iluminismo e, na abertura do segundo período conciliar, transferí-la para uma esfera romântica, para fazer dela “uma ponte para o mundo contemporâneo”, comunicando a ele “a sua vitalidade interior... como fenômeno vivificante e instrumento de salvação do próprio mundo”. A ave fênix tornava-se assim uma ponte, um coeficiente de vida, um instrumento de salvação. Sem perder, porém, o seu parentesco com a matriz iluminista, através da inspiração neomodernista dos seus apoiadores. Não à toa, a partir de uma teologia pastoral assim entendida tem origem a secularização que, mais tarde, triunfará na presente fase pós-conciliar. E se da ignorância dos seus precedentes depende a indecisa noção de pastoralidade, de seu originário parentesco com eles dependeria o absurdo da dogmática de um concílio que se auto-definiu simplesmente pastoral. A ave fênix, dessa forma, revela o seu rosto. Somando tudo isto, teria sido melhor se ela tivesse continuado a escondê-lo.
t.n.: Apresentamos a tradução da preleção de Monsenhor Brunero Gherardini no Congresso sobre o Vaticano II realizado em Roma, em dezembro de 2010, pelos Franciscanos da Imaculada.

jueves, 26 de julio de 2012

Apócrifos-Literatura cristã greco-romana ou judaica-cristã.


Os Livros apócrifos (gregoαπόκρυφοςlatimapócryphus; português: oculto[1]), também conhecidos como Livros Pseudo-canônicos, são os livros escritos por comunidades cristãs e pré-cristãs (ou seja, há livros apócrifos do Antigo Testamento) nos quais os pastores e a primeira comunidade cristã não reconheceram a Pessoa e os ensinamentos de Jesus Cristo e, portanto, não foram incluídos no cânon bíblico.
O termo "apócrifo" foi criado por Jerônimo, no quinto século, para designar basicamente antigos documentos judaicos escritos no período entre o último livro das escrituras judaicas, Malaquias e a vinda de Jesus Cristo. São livros que, segundo a religião em questão, não foram inspirados por Deus e que não fazem parte de nenhum cânon. São também considerados apócrifos os livros que não fazem parte do cânon da religião que se professa.
A consideração de um livro como apócrifo varia de acordo com a religião.[2] Por exemplo, alguns livros considerados canônicos pelos católicos são considerados apócrifos pelos judeus e pelos evangélicos (protestantes). Alguns destes livros são os inclusos na Septuagintapor razões históricas ou religiosas.[3] A terminologia teológica católica romana/ortodoxa para os mesmos é deuterocanônicos, isto é, os livros que foram reconhecidos como canônicos em um segundo momento (do grego, deutero significando "outro").[4] Destes fazem parte os livros de TobiasJuditeI e II MacabeusSabedoria de SalomãoEclesiástico (também chamado Sirácide ou Ben Sirá), Baruc (ou Baruque) e também as adições em Ester e em Daniel - nomeadamente os episódios da História de Susana e de Bel e o dragão.
Os apócrifos são cartas, coletâneas de frases, narrativas da criação e profecias apocalípticas. Além dos que abordam a vida de Jesus ou de seus seguidores, cerca de 50 outros contêm narrativas ligadas ao Antigo Testamento.[5]

Católicos

Para alguns teólogos, e para a maioria dos historiadores, os livros do novo testamento, assim como os textos apócrifos, datam de muito tempo após a vida de Jesus, sendo alguns deles escritos mais de 200 anos após a morte e ressurreição, não podendo ser considerados fidedignos, ou seja, nem tudo o que neles fora escrito narra com precisão a verdade.
Os livros apócrifos foram retirados do Cânon Cristão por monstrarem um Cristo diferenciado dos Evangelhos e teologias escolhidos, mostrando-o exclusivamente como Deus sem as limitações e sentimentos humanos, o que tornaria a passagem pela morte algo fácil, diminuindo assim, o tamanho do Sacrifício realizado pelo Salvador; em outros, entretanto, a imagem de Cristo é excessivamente mundana e em desacordo com a imagem passada pelos quatro evangelhos oficiais.
Muitos textos seculares citam textos Apócrifos, como por exemplo o livro e filme "O Código da Vinci", que utiliza fatos encontrados nestes, para melhorar trama do livro, visto que são poucos os que conhecem, mesmo que parcialmente.

Cristianismo ocidental

No cristianismo ocidental atual existem vários livros considerados apócrifos; nos sínodos realizados ao longo da história esses livros foram banidos do cânon (Livros Sagrados), outros obtiveram uma reconsideração e retornaram à condição de Sagrados (Canônicos). Como exemplo de canonicidade temos a Bíblia (reunião de vários livros).
Os livros Apócrifos são muito estudados actualmente pelos teólogos, porque a sua narrativa ajuda a revelar factos e curiosidades a respeito dos primórdios do cristianismo
O número dos livros apócrifos é maior que o da Bíblia canônica. É possível contabilizar 113 deles, 52 em relação ao Antigo Testamento e 61 em relação ao Novo.[6] A tradição conservou outras listas dos livros apócrifos, nas quais constam um número maior ou menor de livros. A seguir, alguns desses escritos segundo suas categorias.


A quantidade de livros

O número dos livros apócrifos é maior que o da Bíblia canônica. É possível contabilizar 113 deles, 52 em relação ao Antigo Testamento e 61 em relação ao Novo.[6] A tradição conservou outras listas dos livros apócrifos, nas quais constam um número maior ou menor de livros. A seguir, alguns desses escritos segundo suas categorias.

Referências

  1.  Palestra virtual pela Editora Cléofas de Dr. Felipe Aquino da Canção Nova.
  2.  FONSATTI, J.C. "Introdução à Bíblia", Ed. Vozes.
  3.  Septuagint - What Does It Contain?
  4.  [1]
  5.  Revista Galileu - Dezembro 2002 - No 137, conforme www.guia.heu.nom.br/apocrifos.htm, em 23/05/2010
  6.  [2]





obs.:

Lista de livros apócrifos


Antigo Testamento

  1. A vida de Adão e Eva
  2. Apocalipse de Moisés
  3. Apocalipse de Sidrac
  4. Ascensão de Isaías
  5. Assunção de Moisés
  6. Caverna dos Tesouros
  7. Epístola de Aristéas
  8. Livro dos Jubileus
  9. Martírio de Isaías
  10. Oráculos Sibilinos
  11. Prece de Manassés
  12. Primeiro Livro de Adão e Eva
  13. Primeiro Livro de Enoque
  14. Quarto Livro dos Macabeus
  15. Revelação de Esdras
  16. Salmo 151
  17. Salmos de Salomão
  18. Samuel Apócrifo
  19. Segundo Livro de Adão e Eva
  20. Segundo Livro de Enoque
  21. Segundo Tratado do Grande Seth
  22. Terceiro livro de Enoque
  23. Terceiro Livro dos Macabeus
  24. Testamento de Abraão
  25. Testamento dos Doze Patriarcas


Escritos de Qumran


  1. A Nova Jerusalém (5Q15)
  2. A Sedutora (4Q184)
  3. Antologia Messiânica (4Q175)
  4. Bênção de Jacó (4QPBl)
  5. Bênçãos (1QSb)
  6. Cânticos do Sábio (4Q510-4Q511)
  7. Cânticos para o Holocausto do Sábado (4Q400-4Q407/11Q5-11Q6)
  8. Comentários sobre a Lei (4Q159/4Q513-4Q514)
  9. Comentários sobre Habacuc (1QpHab)
  10. Comentários sobre Isaías (4Q161-4Q164)
  11. Comentários sobre Miquéias (1Q14)
  12. Comentários sobre Naum (4Q169)
  13. Comentários sobre Oséias (4Q166-4Q167)
  14. Comentários sobre Salmos (4Q171/4Q173)
  15. Consolações (4Q176)
  16. Eras da Criação (4Q180)
  17. Escritos do Pseudo-Daniel (4QpsDan/4Q246)
  18. Exortação para Busca da Sabedoria (4Q185)
  19. Génesis Apócrifo (1QapGen)
  20. Hinos de Ação de Graças (1QH)
  21. Horóscopos (4Q186/4QMessAr)
  22. Maldições de Satanás e seus Partidários (4Q286-4Q287/4Q280-4Q282)
  23. Melquisedec, o Príncipe Celeste (11QMelq)
  24. O Triunfo da Retidão (1Q27)
  25. Oração Litúrgica (1Q34/1Q34bis)
  26. Orações Diárias (4Q503)
  27. Orações para as Festividades (4Q507-4Q509)
  28. Os Iníqüos e os Santos (4Q181)
  29. Os Últimos Dias (4Q174)
  30. Palavras das Luzes Celestes (4Q504)
  31. Palavras de Moisés (1Q22)
  32. Pergaminho de Cobre (3Q15)
  33. Pergaminho do Templo (11QT)
  34. Prece de Nabonidus (4QprNab)
  35. Preceito da Guerra (1QM/4QM)
  36. Preceito de Damasco (CD)
  37. Preceito do Messianismo (1QSa)
  38. Regra da Comunidade (1QS)
  39. Rito de Purificação (4Q512)
  40. Salmos Apócrifos (11QPsa)
  41. Samuel Apócrifo (4Q160)
  42. Testamento de Amran (4QAm)

Outros escritos


  1. História do Sábio Ahicar
  2. Livro do Pseudo-Filon
  3. Evangelho de Judas

Manuscritos de Nag Hammadi



Apócrifos do Novo Testamento

Literatura da era Patrística greco-romana

Os Apócrifos do Novo Testamento, também conhecidos como "evangelhos apócrifos", são uma coletânea de textos anônimos, escritos nos primeiros séculos do cristianismo, não reconhecidos pelo cristianismo ortodoxo e que, por isso, não foram incluídos no Cânone do Novo Testamento. Não existe um consenso entre todos os ramos da fé cristã sobre o que deveria ser considerado canônico e o que deveria ser apócrifo

Definição


O termo "apócrifos" vem do grego ἀπόκρυφα e significa, justamente, "coisas escondidas". O termo é geralmente aplicado para designar livros que já foram considerados pela igreja como úteis, mas não divinamente inspirados. Assim sendo, referir-se a escritos gnósticos como "apócrifos" pode ser enganador, pois muitos deles não são assim classificados por fiéis mais ortodoxos do ponto de vista doutrinário. A partir do Concílio de Trento, a palavra "apócrifo" adquiriu conotação eminentemente negativa e se tornou sinônima de "espúrio" ou "falso".
Que algumas obras são categorizadas como Apócrifas do Novo Testamento é algo indicativo das ampla gama de interpretações que a mensagem de Jesus provocou. Durante os primeiros séculos da transmissão desta mensagem, um considerável debate se criou para preservar sua autenticidade. Três métodos principais de endereçar esta questão sobreviveram até os nossos dias: ordenação, onde grupos autorizam indivíduos como professores confiáveis da mensagem; credos, onde os grupos definem as fronteiras de interpretação da mensagem; e os cânones bíblicos, que listam os documentos primários que cada grupo acredita conterem a mensagem originalmente ensinada por Jesus. Muitos livros antigos sobre Jesus não foram incluídos nos cânones e hoje em dia são chamados de "apócrifos". Alguns deles foram vigorosamente condenados e suprimidos, sobrevivendo hoje apenas em fragmentos. As mais antigas listas de obras autênticas do Novo Testamento não são idênticas às listas modernas. Como exemplo, o Apocalipse foi durante muito tempo considerado como não-autêntico (veja Antilegomena), enquanto que o Pastor de Hermas era considerado genuíno por alguns cristãos (e ainda é em alguns ramos da fé cristã), e aparece no Codex Sinaiticus.
Da mesma forma que o Antigo Testamento, a maioria dos livros do Novo Testamento foram aceitos pela igreja logo de início, sem objeções: os chamados homologoumena. Isso porque os pais da igreja foram unânimes a favor de sua canonicidade. Os homologoumena aparecem em praticamente todas as principais tradições e cânones da igreja primitiva: eles formam 20 dos 27 livros que entraram no Canon do Novo Testamento.

Antilegomena


As obras que se apresentam como "autênticas", mas que não obtiveram aceitação geral de todas as igrejas são chamadas de "Apócrifos do Novo Testamento". Elas não são aceitas como canônicas pela maior parte das denominações principais do cristianismo. Como exemplo, atualmente apenas a Igreja Ortodoxa da Etiópia reconhece o Pastor de HermasI ClementeAtos de Paulo e diversos Apócrifos do Antigo Testamento, textos que as demais denominações cristãs consideram como apócrifos.
Peshitta siríaca, utilizada por todas as várias igrejas siríacas, originalmente não incluía 2 Pedro, 2 João, 3 João, Judas e Apocalipse (e este cânone de 22 livros é o que foi citado por São João Crisóstomo - 347-407 d.C. - e Teodoreto - 393-466 d.C. - da Escola de Antioquia)[1]. O siríacos ocidentais adicionaram os cinco livros faltantes ao seu Novo Testamento na era moderna[1] (como a Lee Peshitta de 1823). Atualmente, os lecionários oficiais seguidos pela Igreja Síria Ortodoxa de Malankara e a Igreja Síria Caldéia, também conhecida como Igreja do Oriente (Nestoriana), apresentam ainda apenas lições sobre os 22 livros da Peshitta original[1].
Igreja Apostólica Armênia por vezes já incluiu a Terceira Epístola aos Coríntios, mas não a lista sempre com os outros 27 livros canônicos do Novo Testamento. Esta igreja não aceitava o Apocalipse em sua bíblia até 1200 d.C.[2]. O Novo Testamento da Bíblia copta, adotado pela Igreja do Egito, inclui as duas Epístolas de Clemente.

História


A primeira separação oficial entre os textos aconteceu em 325 no Primeiro Concílio de Nicéia, convocado pelo imperador romano Constantino, que havia aderido ao cristianismo; a separação atual foi imposta pelo Concílio de Trento, convocado pelo Papa Paulo III, representante máximo da Igreja Católica, realizado de 1545 a 1563. Mas bem antes disso, ospais da igreja, já no século II, combateram esses textos nos seus escritos. Eusébio, por exemplo, os denomina como "totalmente absurdos e ímpios". Desde o início do Cristianismo parece ter havido fraudes. O apóstolo Paulo, por exemplo, começou a assinar suas cartas por causa de textos falsos que circulavam na igreja no já no século I (II Tes 3:17 e 2:2).

Evangelhos


Evangelhos canônicos


Dos muitos evangelhos escritos na antiguidade, apenas quatro foram aceitos como parte do Novo Testamento, ou seja, como canônicos.

Evangelhos da Infância


A escassez de informações sobre a infância de Jesus nos evangelhos canônicos provocaram uma grande demanda entre os primeiros cristãos por mais detalhes sobre os primeiros anos da vida Dele. Esta demanda foi logo suprida por diversos textos do século II d.C. e seguintes, conhecidos como "Evangelhos da Infância", nenhum dos quais foi aceito no cânon bíblico, embora o grande número de exemplares sobreviventes ateste a sua contínua popularidade.
A maior parte deles foi baseada no mais antigo dos evangelhos da infância, o Evangelho da Infância de Tiago (também chamado de "Proto-Evangelho de Tiago"), no Evangelho da Infância de Tomé e na combinação posterior de ambos no Evangelho de Pseudo-Mateus (também chamado de "Evangelho da Infância de Mateus" ou "Nascimento de Maria e Infância do Salvador").
Outros evangelhos da infância entre os mais antigos são:
  1. Evangelho da Infância Siríaco (ou Evangelho Árabe da Infância)
  2. História de José, o carpinteiro
  3. Vida de João Batista
  4. Evangelho Armênio da Infância de Jesus

Evangelhos Judaico-cristãos


Seitas judaico-cristãs durante o cristianismo primitivo ainda mantinham uma forte relação com o Judaísmo, mantendo a Lei mosaica e utilizavam evangelhos especícicos:
  1. Evangelho dos Hebreus
  2. Evangelho dos Nazarenos
  3. Evangelho dos Ebionitas (século II) é uma tentativa gnóstico-cristão de perpetuar as práticas do Antigo Testamento.

Versões rivais dos evangelhos canônicos


Muitas versões alternativas e editadas de outros evangelhos existiram durante os primeiros anos do Cristianismo. Na maior parte das vezes, o texto afirma ser a versão mais antiga ou a versão que retirou todas as adições e distorções feitas por oponentes às versões mais reconhecidas do texto. Os padres da igreja insistiram que essas eram as pessoas que estavam a fazer distorções, ainda que nem todos os estudiosos modernos concordem. Ainda é tema de debate se existe ou não alguma versão mais antiga ou mais acurada dos evangelhos canônicos. Detalhes de seus conteúdos só sobreviveram na forma dos ataques feitos a eles por seus opositores e, por isso, é incerto quão diferentes eles são entre si e mesmo se constituem obras inteiramente diferentes ou não. Entre os textos dessa natureza estão:
  1. Evangelho de Marcião
  2. Evangelho de Mani, também chamado de Evangelho Vivo ou Evangelho dos Vivos
  3. Evangelho de Apeles
  4. Evangelho de Bardesanes
  5. Evangelho de Basilides
  6. Evangelho de Cerinto

Evangelhos de ditos


Alguns evangelhos tomaram a forma de pequenas logia - ditos e parábolas de Jesus - que não estão inseridos numa narrativa conecatada:
Uma minoria dos estudiosos considera o Evangelho de Tomé como parte de uma tradição da qual os evangelhos canônicos eventualmente emergiram. Em todo caso, ambos são importantes para visualizarmos como seria o teórico Documento Q.

Evangelhos da Paixão


Outro conjunto de Evangelhos se focam especificamente na Paixão (prisão, execução e ressurreição) de Jesus:
Embora três textos tomem para si o nome de Bartolomeu, é possível que ou as "Questões" ou a "Ressurreição" sejam, na verdade, o desconhecido "Evangelho de Bartolomeu".

Evangelhos Harmônicos


Uma quantidade dos textos tenta apresentar uma única harmonização dos evangelhos canônicos que elimine as discordâncias entre eles e apresente um texto unificado derivado da união de todos. A mais famosa dessas versões é o Diatessarão. De todos os textos sobreviventes, a maioria parece ser uma variação do suprimido Diatessarão.

Textos gnósticos


Na era moderna, muitos textos gnósticos foram recuperados, especialmente após a descoberta da Biblioteca de Nag Hammadi em 1945. Alguns textos expõem a cosmologiaesotérica e a ética defendida pelos gnósticos. Muitas vezes, isso ocorre na forma de diálogos em que Jesus expõe seu conhecimento esotérico enquanto seus discípulos fazem perguntas. Há também um texto, conhecido como Epistula Apostolorum, que é uma polémica contra o esoterismo gnóstico, mas escrito de maneira similar aos textos gnósticos[3].

Diálogos com Jesus


Textos sobre Jesus



Textos setianos sobre Jesus


Os setianos eram um grupo que originalmente adoravam o bíblico Sete como uma figura Messiânica, tratando depois Jesus como uma reencarnação de Sete. Eles produziram numerosos textos expondo a sua cosmologia esotérica, geralmente na forma de visões:

Diagramas rituais


Alguns dos textos gnósticos parecem consistir de diagramas e instruções para uso em rituais religiosos:

Atos Apócrifos


Os "Atos de Apóstolos" eram um gênero literário durante o cristianismo primitivo, que contava a história do movimento cristão após a Ascensão de Jesus através das vidas e obras de seus apóstolos, principalmente São PedroJoão e Paulo, um convertido. O texto chamado Atos dos Apóstolos atualmente foi incluído no cânon bíblico e é a segunda parte de uma obra cuja primeira é o Evangelho segundo Lucas, com ambas dedicadas à Teófilo e com estilo similar [4].
Entre os apócrifos, diversos textos tratam da vida subsequente dos apóstolos, usualmente pontuadas com eventos fortemente sobrenaturais. Existe uma tradição de que uma parte deles tenha sido escrito por Leucius Charinus (conhecidos como Atos Leucianos), um companheiro de João apóstolo. Os "Atos de Tomé" e os "Atos de Pedro e os doze" são considerados também textos gnósticos. Ainda que a maioria dos textos tenha sido escrita no século II d.C., pelo menos dois, os "Atos de Barnabé" e os "Atos de Pedro e Paulo" podem ter sido escritos tão tarde quanto o século V d.C.

Epístolas


Há também diversas epístolas não canônicas (ou "cartas") entre os indivíduos ou para os cristãos em geral. Algumas delas foram consideradas muito importantes pela igreja antiga:

Apocalipses Apócrifos


Diversas obras estão estruturadas na forma de visões escatológicas, discutindo o futuro, a vida após a morte ou ambos:

Destino de Maria


Muitos textos (mais de cinquenta) são descrições dos eventos que circundaram o destino variado de Maria ( a mãe de Jesus):

Miscelânea


Estes textos, por seu conteúdo ou forma, não se encaixam em nenhuma das categorias:

Fragmentos


Além das obras apócrifas conhecidas, há também diversos pequenos fragmentos de textos, partes de obras desconhecidas e de existência incerta. Alguns dos mais importantes são:

Obras perdidas


Existem diversos textos mencionados em muitas fontes antigas e que seriam certamente considerados parte dos apócrifos, mas nada sobreviveu deles:

Ortodoxia


Ainda que muitos livros citados aqui sejam considerados heréticos (especialmente os que pertencem às tradições gnósticas), outras não são consideradas particularmente heréticas no conteúdo e são na realidade aceitos como livros de importante valor espiritual. Não são, porém, considerados canônicos.
Entre os historiados do Cristianismo primitivo, estes livros tem valor incalculável, especialmente os que quase entraram no cânon final, como o Pastor de HermasBart Ehrman, por exemplo, diz:
Os vitoriosos nas disputas para estabelecer a ortodoxia cristão não apenas ganharam suas batalhas teológicas, mas também reescreveram a história do conflito. Os líderes posteriores então naturalmente assumiram que os pontos de vista vitoriosos tinham sido abraçados pela vasta maioria dos cristãos desde o início... A prática da falsificação cristã tem uma longa e distinta história... o debate durou mais de trezentos anos... mesmo dentro dos círculos "ortodoxos" havia considerável debate sobre quais livros deveriam ser incluídos [no cânon].
 
— Barth Ehrman, Lost Christianities[5]



Os principais evangelhos apócrifos e a razão de sua proibição pela Igreja Católica [6]



EvangelhoConteúdoMotivo da proibiçãoDescoberta
Evangelho de PedroCirculou provavelmente no século II, de autoria atribuída ao apóstolo Pedro; conta uma versão diferente da ressurreição de Cristo, que teria sido conduzido ao céu por dois anjos.Foi acusado de ser uma heresiadenominada “docetismo”, segundo a qual Jesus era somente espírito.Foi encontrado um fragmento do texto por arqueólogos franceses, na tumba de um monge no Egito, em 1886.
Evangelho de FilipeCirculou no século III, possui histórias que não estão nos demais evangelhos daBíblia, como a de que Jesus mudava de aparência para conhecer aqueles a quem se revelava. Além disso, sugere seu relacionamento com Maria Madalena.Possui conteúdo gnóstico e afirma que só mulheres virgens entravariam noParaíso (o que inviabilizaria as famílias)Encontrado em 1945, em meio aos manuscritos enterrados num vaso naBiblioteca de Nag Hammadi.
Evangelho de Maria MadalenaNos poucos fragmentos que restaram, Cristo ressuscitado instrui seus discípulos a espalhar o gnosticismo e avisa que não deixou leis. Também afirma que Jesus transmitiu segredos a Madalena.O texto é gnóstico, foi condenado comoheresiaUma parte foi descoberta em um mosteiro egípcio em 1896; outra versão estava na Biblioteca de Nag Hammadi.
Evangelho de ToméTexto provavelmente do século I, possui 114 frases atribuídas a Jesus; em que Ele afirma que a salvação vem do autoconhecimento e que a centelha divina está em cada um.Contéudo gnósticoDescoberto na Biblioteca de Nag Hammadi em 1945.

Bibliografia


  • QUÉRÉ, France (introdução). Evangelhos apócrifos. Lisboa: Editorial Estampa, 1991. ISBN 972-33-0780-4
Inclui o texto dos evangelhos apócrifos.

Referências

  1. ↑ a b c Peshitta (em inglês)
  2.  http://www.theologicalperspectives.com/RELIABILITY4.html Confiabilidade] (em inglês)
  3.  James M. Robinson(em inglês). [S.l.]: HarperOne, 1990.
  4.  Hans-Josef KlauckThe Apocryphal Acts of the Apostles: An Introduction (em inglês). Baylor UP: [s.n.], 2008.
  5.  Bart D. EhrmanLost Christianities (em inglês). [S.l.]: Oxford University Press, 2003.
  6.  Tabela baseada de informações obtidas da matéria "Um outro Jesus" da Revista Superinteressante (Edição 207 - dezembro/2004): http://super.abril.com.br/historia/outro-jesus-444985.shtml